quinta-feira, 9 de outubro de 2014

Aumento do salário mínimo temporário: a “Jabuticaba Portuguesa”

O governo Português apresentou um projeto de aumento do salário mínimo nacional (SMN) do antigo valor de 485 euros para os atuais 505 euros, contestando determinações de Bruxelas e dos credores internacionais quanto a um maior esforço quanto à consolidação orçamental do país. O sistema de monitoramento da União Europeia foi duro face ao país ao afirmar que Portugal deveria “Manter a evolução do salário mínimo coerente com os objetivos de promoção do emprego e da competitividade. Assegurar um sistema de fixação de salários que promova o alinhamento dos salários e da produtividade a nível setorial e/ou a nível de empresa.” 
O aumento salarial de 4% ante o previsto crescimento da produtividade de 1% é contestável ao nível da teoria econômica neoclássica, na qual os salários devem crescer de forma proporcional ao aumento da produtividade. Uma aplicação simplória da Lei de Okun, mesmo para números tão grandes de desemprego, é válida como exercício para ver que é preciso um aumento no PIB para diminuir a taxa de desemprego. Contudo, Portugal experimenta taxas de crescimento negativas do produto interno bruto há mais de cinco anos, a taxa de desemprego não cai e mesmo assim um aumento salarial é fornecido aos trabalhadores. 
Segundo dados do Banco Mundial e FMI, este será o primeiro ano desde o início da crise que Portugal terá um crescimento expressivo, chegando a 1% ao ano. Este aumento do PIB português já reflete um maior nível de emprego: a taxa de emprego experimentou um aumento 1,6% no primeiro e segundo semestres, se comparados com o mesmo período do ano anterior, segundo dados do Eurostat. 
Quanto à questão da confiança e motivação do trabalhador, este aumento é um fato primoroso, pois melhora a situação econômica de muitas famílias que desde o início da crise passam por situação difícil, que pode gerar um aquecimento na economia com o aumento do consumo. O país passa a ter uma pequena folga quanto à dependência do mercado externo, com o fomento ao mercado interno, já que são mais de 300 mil trabalhadores a auferir mais 20 euros de renda mensal. 
Contudo, existem pontos negativos na proposta do aumento do SMN: a temporalidade é um fator crítico. Quando o SMN de 505 euros deixar de vigorar em 1º de janeiro de 2016, cria-se uma situação delicada em que não se pode abaixar o salário para quem já o recebia por esta ação ir contra o Código de Trabalho português, e uma questão quanto à contratação de novos trabalhadores, recebendo o antigo SMN que seria menor que o atual, criando uma situação ímpar de trabalhadores da mesma categoria com SMN diferentes, situação que não seria aceite pelos sindicatos e/ou associações de trabalhadores. 
Outra questão é o aumento dos custos operacionais das empresas com o aumento do SMN. Segundo dados do Gabinete de Estratégia e Estudos do Ministério da Economia, as microempresas, com menos de nove empregados, são as que mais sofrerão com o aumento do SMN. Empresas médias e grandes sofrem menos com este aumento, não sendo motivo de grande preocupação quanto ao risco de demissões massivas ou insolvência das empresas. O problema de muitas empresas não são só os custos, como querem enfatizar. Muitas delas passam por má gerência há anos e querem se safar de prejuízos às custas do trabalhador. 
A questão apresentada no título quanto à “jabuticaba portuguesa” vem de uma analogia a uma fruta que só existe no Brasil, e o uso do termo serve para definir aspectos particulares do país. Uso este termo sobretudo quanto à temporalidade do aumento do SMN, um fato, no mínimo, incomum. A futura situação de impasse jurídico que pode gerar e a ousadia do país de ir contra recomendações de credores internacionais, como o FMI e a União Europeia, em Bruxelas. O período rigoroso de austeridade enfrentado pelos PIGS não se mostrou uma forma mais eficiente de contornar a crise. Uma mudança nos parâmetros de como se trata a atual situação econômica vem a ser positivo para o país. 
Acredito que este aumento possui muito mais faces positivas do que negativas. Se utilizado como um incentivo ao consumo e dinamização econômica, o país pode voltar ao rumo do crescimento, deixando os negros tempos de austeridade e arrocho salarial para trás. 

Filipe Oscar Carneiro Fonseca Leal

Bibliografia:
Jornal Negócios – Nº 2845 de 30 de setembro de 2014.
http://www.publico.pt/economia/noticia/portugal-entre-os-paises-da-ue-com-maior-aumento-do-emprego-1669428

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]  

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