sábado, 15 de novembro de 2014

A economia que não se vê, apenas se sente

A economia paralela constitui um dos retratos mais obscuros de Portugal. Mesmo que não tenhamos consciência daquilo em que esta nos prejudica, é importante ter uma noção básica do seu significado. Assim, fazem parte da economia paralela, ou economia Não-Registada (ENR), como o próprio nome indica, todas as atividades económicas que não são registadas oficialmente. Por outras palavras, são atividades que não são contabilizadas (diretamente) para o Produto Interno Bruto (PIB), ou seja, não pagam impostos e acabam por não contribuir para a riqueza de uma nação. Estão associadas a isto, não só a economia legal que desrespeitas as normas fiscais, chamada de economia subterrânea, mas também a economia ilegal e informal. 
Um estudo realizado pelo observatório de Economia e Gestão de Fraude, da Faculdade de Economia do Porto, afirma queo Estado português perdeu, só no ano transato (2013), mais de 44 milhões de euros com a economia paralela, o equivalente aproximadamente a 26% do PIB. Isto significa que, por cada cem euros transacionados de forma legal, cerca de vinte e seis provieram da economia paralela, aponta o estudo. Será difícil compreender a verdadeira dimensão destes números, mas estima-se que, se o Estado conseguisse controlar a economia paralela por meio de uma tributação mais assertiva, este valor estrondoso era suficiente para tirar o país dos pesados défices orçamentais. Sim, esse défice que tanto nos tem atormentado a nós, Portugueses… A par disso, estão as abdicações e sacrifícios que podiam ser inferiores se esta economia paralela fosse realmente taxada. Dá que pensar! A questão que se coloca é a seguinte: porque serão estes valores tão elevados? E porque é que esta tendência se mantém ano após ano?
A principal causa vai de encontro à carga fiscal, onde se incluem os impostos e contribuições para a segurança social que, por ser tão significativos e em constante aumento, compensam escapar deles. As medidas de austeridade, em especial a de agravamento e aumento dos impostos, deverão fazer com que o país assista a uma subida significativa da economia negra. Estudos comprovam que a tendência de aumento deste tipo de economia será tanto maior quanto maior for o número medidas que o governo continuar a implementar sobre as empresas e contribuintes. Torna-se mais fácil de perceber se tivermos em mente a curva de Laffer, onde existe um ponto ótimo que leva a maior receita arrecadada. A partir desse ponto, a curva é descendente, o que significa que a maior tributação gera menor receita. Isto acontece devido à existência de economia subterrânea, que aumenta com o aumento dos impostos. 
É de realçar que, com esta ganância e ansiedade do Estado de querer recolher cada vez mais e mais impostos, apenas incentiva a fraude fiscal, criando um efeito “bola de neve”. Não menos importante, outra causa passa pela regulação, onde o excessivo peso de consumo do Estado causa necessidade de financiamento. Aliada a esta está o mercado de trabalho, com o desemprego a atingir valores recorde (16,2% em 2013), o que leva as pessoas a encontrar alternativas, que passam pelo trabalho ilegal.
  Este problema tem consequências drásticas ao nível da economia do país. No que toca às empresas, geram-se distorções de concorrência entre as que cumprem e as que não cumprem as suas obrigações fiscais. As que cumprem acabam por ter custos maiores e deste modo lucros inferiores. Isso, mais tarde, levará a empresa a abondar o mercado criando desemprego. 
É notório um clima de incerteza na estabilização da economia, uma vez que os indicadores, sendo influenciados pela ENR, estão mal medidos e enviesados, o que muitas vezes acaba por afetar as decisões políticas, tornando-se desajustadas da realidade. Globalmente, como se comprova, o efeito é o de um país injusto, com maiores desigualdades sociais e económicas, originando, portanto, grave injustiça social. 
Com tudo isto, torna-se importante tomar medidas de combate a esta economia negra. Já foram criadas algumas, como o uso obrigatório de máquinas registadoras de passar recibo em qualquer compra. Outra também conhecida e importante foi a criação do sorteio “ fatura da Sorte”, destinada aos contribuintes que apresentarem faturas, o que força os mesmos a pedi-las, obrigando o prestador ou vendedor a declarar o que vendeu, não conseguindo desta maneira fugir à contabilidade fiscal. 
Em jeito de conclusão, podemos afirmar que o "fenómeno obscuro" que, em percentagem, equivale a um quarto do peso do PIB, traduz-se numa falta de eficiência das medidas que o governo tem vindo a implementar, contribuindo assim para um maior desajuste e aumento da desigualdade que, por conseguinte, revela que as novas opções devem ter efeito se levarmos em conta a qualidade e não a quantidade.

José Luís Silva

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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