quinta-feira, 7 de novembro de 2013

Financiamento das empresas

Num estudo divulgado pelo Banco de Portugal no último mês de outubro, sob o (elucidativo) título Catastrophic Job Destruction, os autores analisam o modo como o mercado de trabalho português respondeu à crise, debruçando-se em particular sobre o emprego e os salários.  
No contexto de recessão internacional, a implementação do Programa de Assistência Financeira a Portugal provocou uma recessão severa, e em quatro anos de crise a taxa de desemprego subiu 10 pontos percentuais (p.p.). Sendo este período marcado por uma queda acentuada da criação de postos de trabalho, os autores defendem que é ao nível da destruição de emprego que se regista a maior diferença em relação a outros períodos de crise. 
Em particular, o encerramento de empresas representou uma destruição de postos de trabalho sem precedentes. Entre 2007 e 2009, a taxa de destruição de emprego por parte de empresas que fecharam subiu 2,6 p.p., sendo que em 2009 foram responsáveis pela destruição de 6,9% do número médio de postos de trabalho que existiram nesse ano. Para o período total analisado (1992-2009), o encerramento de empresas correspondeu, em média, a 36,4% da destruição de postos de trabalho. No entanto, com o avanço da recessão, este número cresceu significativamente, passando de 37,5% em 2006 para 45,6% em 2009.  
Quanto às condições que podem ter contribuído para esta situação, e por serem características da atual recessão em Portugal, os autores exploraram três vias: restrições severas de crédito, flexibilidade de salários limitada e segmentação do mercado de trabalho.  
Focando a atenção apenas no problema das restrições de crédito, desde o início de 2009 que as taxas de juro para novos empréstimos às empresas se afastam cada vez mais das praticadas noutros mercados (por exemplo, a diferença relativamente à Alemanha mais do que triplicou entre janeiro de 2009 e janeiro de 2013). Por outro lado, desde 2009 o nível de dívida das empresas caiu abruptamente. Os autores concluíram que estas restrições de crédito tiveram um papel significativo na destruição de emprego ocorrida. Sustentam que, sobretudo em 2010 e 2011, as empresas com custos financeiros mais altos destruíram postos de trabalho ou encerraram a taxas mais elevadas do que aquelas que tinham condições financeiras menos desfavoráveis. Estes números conduzem naturalmente ao debate da questão da (reduzida) autonomia financeira das empresas e do seu financiamento. 
Num estudo da Central de Balanços do Banco de Portugal, o nível de autonomia financeira das sociedades não financeiras em 2011 situava-se em termos médios em 33%. Apesar de se ter verificado um aumento da dispersão dos resultados, metade das empresas teve autonomias inferiores a 25%, ao mesmo tempo que mais de 25% apresentou capitais próprios negativos. A análise da estrutura do passivo em 2011 destas empresas permite ainda constatar que a dívida financeira e os créditos comerciais constituíam mais de dois terços das suas fontes de financiamento. E na dívida financeira, os empréstimos obtidos junto de instituições de crédito representavam 56% da dívida. No ano de 2011 as empresas viram ainda aumentar os juros suportados em 18% face ao período homólogo, sendo que nas grandes empresas o aumento foi de 32%. 
Num cenário de reduzida autonomia, as empresas ficam especialmente vulneráveis a alterações nas condições de financiamento, pelo que não só é necessário aumentar a autonomia como também diversificar as fontes de financiamento. De qualquer modo, esta mudança estrutural não ocorrerá de um momento para o outro. Entretanto, é preciso que a economia funcione. Se no Programa de Assistência Financeira se pretendia prosseguir um caminho de desalavancagem do sistema bancário gradual, de modo a não comprometer a concessão de crédito aos setores mais produtivos da economia, a verdade é que os ecos continuam a ser de que o financiamento não chega às empresas.

Paula Rego
   
Referências
Banco de Portugal. 2012. Análise setorial das sociedades não financeiras em Portugal 2011/2012. Estudos da Central de Balanços | 8, Novembro 2012 (disponível em: http://www.bportugal.pt/pt-PT/ServicosaoPublico/CentraldeBalancos/Publicacoes/Paginas/EstudosdaCentraldeBalancos.aspx)  
Carneiro, Anabela, Pedro Portugal e José Varejão. 2013. Catastrophic Job Destruction. Working Paper Banco de Portugal, 14 | 2013 - http://www.bportugal.pt/en-US/BdP%20Publications%20Research/wp201314.pdf 

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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