segunda-feira, 2 de outubro de 2017

“FAT TAX”: imposto “camaleão” para a receita fiscal ou voltado para a saúde pública?

Em 2014, à mão do anterior governo, chegou a ser equacionada a implementação de um novo imposto indireto, baseado num alargamento do IABA (Imposto sobre o Álcool e Bebidas Alcoólicas) para as bebidas não alcoólicas com açúcares adicionados ou outros edulcorantes, com exceção dos néctares, sumos de fruta e bebidas à base de leite, mesmo que contenham açúcar. Ora, só a 1 de fevereiro deste ano é que esse novo imposto, comummente conhecido como “fat tax”, entrou em vigor em Portugal, surgindo especialmente como uma sugar tax e podendo ser aplicado em 2 escalões: em bebidas de 1,5L com uma concentração de açúcar inferior a 80gr, a taxa será de 0,15 euros, ao passo que nas que apresentem uma concentração superior a 80gr a taxa sobe para 0,25 euros. Para além disto, a sua tributação pode ocorrer de diferentes formas, estando já em vigor em diversos países da UE. Como termo de comparação surge, por exemplo, a Hungria, que tributa refrigerantes, bebidas energéticas, doces pré-embalados e snacks, e a Finlândia, que para além dos refrigerantes tributa também doces, gelados e chocolates.
O “fat tax”, que hoje em dia tem dado muito que falar, traz consigo uma série de questões em relação ao cerne do seu verdadeiro objetivo: será um veículo para camuflar os aumentos das receitas fiscais ou atua de acordo com preocupações com a saúde? Pessoalmente, acredito que o maior intuito seja apelar à consciência das pessoas em relação aos malefícios de certos alimentos, nunca descurando o facto de proporcionar ganhos fiscais para o Estado, através do aumento da sua receita, e cuja verba será revertida para o Sistema Nacional de Saúde, de acordo com o Governo. Trata-se, portanto, de uma aliança entre a receita do Estado e a intenção de um consumo consciente.
A título de exemplo, o Observatório Nacional da Diabetes, que publicou o relatório "Diabetes: Factos e Números", referente ao ano de 2015, revela que, em média, em Portugal, a diabetes matou cerca de 12 pessoas por dia e que há uma tendência de crescimento no número de novos casos diagnosticados. Perante estes números verdadeiramente assustadores, e sendo o açúcar uma das suas principais causas, faz sentido a adoção de determinadas medidas que balancem e diminuam o consumo destas substâncias por parte do Governo português.
Ora, atualmente, existe - diria até - excesso de informação em relação a temáticas como a nutrição; no entanto (e porque não vivemos num mundo utópico), existe uma assimetria dessa informação, provocada muitas vezes pelos diferentes níveis de escolaridade e conhecimento dos indivíduos, por questões culturais fortemente vinculadas ou através das publicidades, as quais conseguem verdadeiramente atrair e manipular o consumidor para que este compre determinados produtos, induzindo-o em erro em relação às suas caraterísticas nutricionais. Posto isto, acredito que esta nova tributação consiga funcionar como um apelo à consciência das pessoas, alertando-as para que algo está errado nos seus hábitos de consumo.
Não obstante, claro que este objetivo também é difícil de ser enraizado e realizado. Diariamente, conseguimo-nos aperceber da discrepância de preços entres produtos mais saudáveis e aqueles “menos saudáveis”, sendo muitas vezes uma diferença absurda e, inevitavelmente, determinante dos hábitos de consumo das pessoas: classes com menores rendimentos serão mais penalizadas com o novo imposto uma vez que dedicam uma maior proporção do seu rendimento ao consumo, nomeadamente destes produtos que são mais baratos do que os mais saudáveis.
Assim, um “fat tax” poder-se-á tornar num imposto regressivo, já que os sujeitos mais pobres terão que abdicar de uma maior fatia do seu rendimento para suportar o imposto do que os contribuintes mais ricos. Desta forma, embora este novo imposto possa interferir no processo de tomada de decisão das pessoas, acredito que será insuficiente. Penso que uma forma de contornar a situação poderia passar pela aplicação dessa receita fiscal gerada para fomentar a educação ou para subsidiar empresas e incentivá-las à alteração do processo produtivo para práticas mais saudáveis.
Neste seguimento, mesmo após a exposição da minha opinião em relação ao assunto, deparo-me com uma lacuna: o novo imposto pode, de facto, alterar os hábitos de consumo dos cidadãos, mas essa mudança poderá ser apenas limitada aos produtos taxados, não se verificando uma revolução nos hábitos alimentares em geral, o que, a longo prazo, não se traduz numa melhoria da saúde pública assim tão significativa. Dado isto, penso que, para além da tributação ao açúcar vigorante em Portugal, as taxas poderiam incidir também sobre produtos com elevadas concentrações de sal, gordura ou edulcorantes, por exemplo.
Em jeito de conclusão, e porque os indivíduos têm tendência a responder mais rapidamente a incentivos económicos do que propriamente a campanhas ou comunicados acerca dos malefícios de determinados produtos, acredito que se irá verificar uma mudança na mentalidade das pessoas, para além de melhorias na sua saúde, numa perspetiva de longo prazo.

Daniela Costa

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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