sexta-feira, 26 de outubro de 2018

TURISMO: O QUE QUEREMOS?

Dados oficiais estimam que a nível mundial, o sector do turismo tem um contributo direto no PIB de 3,2%, e um contributo direto no emprego de 3,8%. Note-se que os países mais pobres e menos desenvolvidos são alguns dos que apresentam maior peso relativo do turismo, aliás no TOP 50 dos países com maior peso relativo do turismo, a Espanha é um dos poucos que aparece como representante dos países mais desenvolvidos. Em Portugal, o Turismo é responsável por cerca de 7,5% do PIB e aproximadamente 6,0% do emprego. Estes números revelam que estamos acima da média mundial e continuamos numa tendência de crescimento, tal como demonstra o estudo “Estratégia Turismo 2027” (ver gráfico em baixo).
  

Percebemos claramente que o sector do turismo tem um crescimento muito superior ao da média da economia nacional. A pergunta que nos devemos colocar neste momento é a de saber muito bem o que queremos em termos de turismo. A ilusão deste crescimento esconde aspetos negativos que devemos seriamente estudar, isto tanto a nível económico como social e urbanístico.
Segundo o mesmo estudo, percebemos que o nível de qualificação da população empregada no sector do turismo é sofrível, pois cerca de 58% possui apenas o ensino básico. Convém, no entanto, referir que as projeções para 2027 apontam para uma descida desse indicador para um patamar de 12%, sendo que 60% dos empregados terão o ensino secundário. Note-se que essa alteração do panorama do emprego terá muito a ver com a substituição de gerações. Não podemos de facto esconder que o setor estará sempre ligado as camadas de populações menos instruídas. Este será com certeza o maior ponto de discórdia entre os que defendem uma aposta forte no turismo e os que olham para ele com alguma desconfiança.
No que diz respeito à dimensão social traduzida pelo nível de remuneração auferido no sector, é enorme o gap existente com a média dos outros sectores. Na verdade, um trabalhador do sector do turismo recebe um vencimento inferior em 25% à média nacional. Esta bipolaridade da economia Portuguesa é profundamente assustadora no que diz respeito ao setor do turismo. Note-se que esta diferença não é de todo conjuntural, mas sim estrutural, pois a tendência registada é a mesma há pelo menos mais de uma década. Isso resulta do facto já apontado, ou seja, do baixo nível de qualificação da população empregada. É importante ainda referir que, além dos baixos salários, o emprego neste setor é precário e sofre com a dimensão da sazonalidade. 
Do ponto de vista das cidades, tais como Lisboa e Porto, outros problemas se colocam. As mesmas estão a ser reabilitadas para o turismo, o que está a criar uma pressão no mercado imobiliário que impede os residentes de ocuparem os centros urbanos, verificando-se uma verdadeira expulsão para os subúrbios. Isso poderá levar à descaraterização das cidades no que diz respeito à sua dimensão cultural. Do ponto de vista urbanístico, as cidades estão a ser redesenhadas para se ajustarem a esta nova realidade. Nesta fase, observa-se principalmente o investimento através de capitais privados na reabilitação de edifícios, no entanto será de esperar a necessidade de mais investimentos públicos, nomeadamente em infraestruturas aeroportuárias.  
Finalmente, à pergunta, Turismo: o que queremos?, não existe uma resposta agregadora e de sentido único. Deverá o Estado, em tempo de parcos recursos, investir num setor do turismo que já se encontra num nível económico de excelência? O país não deveria focar a sua atenção em promover a competitividade nas outras indústrias, nomeadamente nas que absorvem pessoal qualificado e consequentemente melhor remunerado? Não deveria reforçar o seu investimento na educação e investigação, pois continuamos na cauda da Europa nesses dois indicadores? Em termos de educação na Europa a 28, apenas Malta tem pior desempenho que Portugal, pois constata-se ainda que menos de 50% da população entre 20 e 64 anos possui pelo menos o ensino secundário. Será justificável pedir mais esforços aos contribuintes para financiar um setor que nunca explorará ao máximo as habilitações e competências com as quais estamos as formar as novas gerações? Parece-me que a estratégia a seguir não se esgota no documento “Estratégia Turismo 2027”. É imprescindível produzir documentos alternativos que permitem comparar cenários com os seus custos envolvidos, bem como os retornos financeiros, sociais e culturais.

Filipe Pereira

[artigo de opinião escrito no âmbito da Unidade Curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano (1º ciclo) do curso de Economia da EEG/Universidade do Minho]

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