quarta-feira, 31 de outubro de 2018

Salário exageradamente reduzido ou exageradamente elevado?

         No mês passado, dois partidos políticos discutiram as diferenças salariais entre gestores e trabalhadores, o que levou também à atenção de alguns jornais nacionais. Não só existem diferenças salariais entre gestores e trabalhadores como entre género nos cargos mais elevados, assim como a dificuldade de progressão na carreira para as mulheres.
O caso mais mediático de diferença entre gestor e trabalhadores é o do CEO da EDP, em que o salário que António Mexia recebe é quase 40 vezes mais que o salário médio dos trabalhadores. Ainda assim, Mexia está longe de liderar o ranking da disparidade salarial entre gestor e trabalhadores. A maior disparidade acontece no grupo Jerónimo Martins, onde Pedro Soares dos Santos auferiu uma remuneração acima dos dois milhões de euros em 2017, ganhando 160 vezes mais do que a remuneração média atribuída aos trabalhadores. O salário de Pedro Soares dos Santos equivaleu a quase 260 salários mínimos nacionais. O setor do retalho é o que apresenta maior disparidade. Além de Pedro Soares dos Santos, em 2017, o CEO da SONAE, Paulo Azevedo recebeu quase 40 vezes mais que a remuneração média atribuída aos trabalhadores.
         Segundo uma análise da Bloomberg, em média o CEO americano ganhava, em 2017, cerca de 265 vezes mais que os trabalhadores. É um rácio superior àqueles que se verificam, por exemplo, na Índia (229) ou Reino Unido (201). Espanha (143), Alemanha (136) e China (127) fecham o ranking dos 10 países com maiores disparidades, de acordo com a análise da Bloomberg, com base nos principais índices bolsistas em 22 países. Em Portugal, um gestor do PSI-20 ganha, em média, 23 vezes mais que os trabalhadores.
         As mulheres representam cerca de metade da força de trabalho da União Europeia, mas continuam a ter pouca expressão em cargos de topo. Segundo estatísticas do Eurostat, citadas pelo Dinheiro Vivo, do total de 7,3 milhões de gestores na UE, 4,7 milhões são homens e os restantes 2,6 milhões são mulheres. Ou seja, apenas um terço do total dos cargos são ocupados por mulheres. A divergência também acontece em relação aos salários, sendo que, nas posições de topo, a diferença é de 23,4%, favorável ao sexo masculino. Mas há exceções: a Letónia é o único país da UE onde as mulheres ocupam mais cargos de chefia do que os homens. Em Portugal, o rácio é de 3,3 mulheres por cada dez cargos de gestão. A média está abaixo dos 35% registados no total da UE.
         No final do mês passado, foi discutido na Assembleia da República a disparidade entre gestor e trabalhador e o Bloco de Esquerda apresentou um projeto de lei que impunha um diferencial máximo entre a remuneração mais elevada e a mais baixa das empresas. O Partido Socialista não apoiou a proposta, apesar de também já ter apresentado uma proposta que tinha por base o aumento da TSU ou impedimento de subsídios à criação de emprego.  A proposta do PS de aumentar a TSU para travar as disparidades salariais recebeu várias críticas por parte dos empresários nacionais. Estes dizem que a medida em nada resolve as diferenças salariais e relembram que as remunerações nas empresas privadas não são responsabilidade dos partidos políticos. Apesar de os empresários reconhecerem que há casos gritantes de disparidades, a maioria diz que isso são situações pontuais e que essas diferenças são pouco acentuadas na maioria das empresas nacionais.
         Na minha opinião, não é comparável o trabalho prestado por um gestor e um trabalhador, por diversos motivos. No caso da diferença de género, é mais facilmente comparável, mas pode existir uma mulher com melhor desempenho que um homem ou o contrário. Penso que o sexo de uma pessoa não deve definir o seu salário mas sim o trabalho que presta à entidade. Para já, o PS considera muito cedo para legislar sobre as disparidades salariais e, na minha opinião, apesar do Estado ter um papel regulador, não deve legislar nesta matéria pois apenas iria criar ambiguidade porque, se as empresas querem pagar esses salários aos seus gestores, iriam criar mecanismos de os compensar de outra forma. Mas também concordo que se chame a atenção para estes assuntos e que sejam discutidos de forma a perceber se o trabalho desses gestores vale realmente esse salário e, caso não valha, os acionistas devem tomar uma atitude.

Adriana Catarina Rebelo Serra

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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