terça-feira, 2 de outubro de 2018

“Um país grisalho”

          É já sabido que Portugal é cada vez mais conhecido como sendo um país de velhos. Apesar de todas questões económicas e de sustentabilidade que o envelhecimento levanta, viver mais é uma conquista da sociedade moderna. As pessoas vivem mais anos graças ao aumento do conhecimento técnico e científico, que proporciona uma melhoria na qualidade de vida. Também o acesso generalizado aos cuidados de saúde e uma consciencialização para a adoção de hábitos mais saudáveis contribui para o aumento da esperança média de vida. Assim, concluímos que o processo de envelhecimento demográfico resultou da evolução da sociedade, e esta deve ser capaz de aceitar este fenómeno de forma natural, desenvolvendo estruturas de suporte e apoio eficientes de modo a suprimir as necessidades da população.
      Aliado ao envelhecimento da população surge também a preocupação relativamente à diminuição do número de jovens. Em 1961, a taxa de fecundidade rondava os 95,7%, enquanto que em 2017 este valor era aproximadamente 30%. Um estudo realizado pelo PORDATA mostra que em 2016 uma pessoa com 65 anos poderia viver em média mais 19,5 anos, enquanto que em 1970 uma pessoa com a mesma idade poderia viver apenas mais 13,5 anos. Dada esta tendência, o envelhecimento da população traz novos desafios aos países, nomeadamente no sector da saúde e segurança social. A agência de rating Moody’s revelou que a maioria dos países da UE vão estar “super envelhecidos” em 2030, com mais de 20% da população a ter 65 anos ou mais. Portugal é dos países da União Europeia que mais sentirá a pressão causada pelo envelhecimento da população e pela redução do número de jovens.
 A questão, que remete para uma adaptação da segurança social, já foi discutida e analisada anteriormente e as alterações implementadas têm garantido um bom desempenho, pelo menos no curto prazo. O sistema de segurança social atualmente em vigor é um sistema de repartição, onde se realizam transferências de indivíduos em idade ativa para os aposentados, cujo intermediário principal é o Estado. O sistema é centrado sobretudo num contrato de solidariedade intergeracional, verificando-se um desequilíbrio enorme entre os contribuintes e os beneficiários. Assim, destaca-se a forte dependência do sistema dos fatores demográficos. A diminuição da população ativa leva a uma redução das contribuições para a segurança social. O índice de sustentabilidade potencial (IPS) mostra quantas pessoas entre os 15 e 64 anos (em idade ativa) existem por cada idoso. Em 1961, existiam cerca de 8 pessoas em idade ativa para cada idoso. Em 2017, existiam apenas 3 pessoas. Para além disso, o aumento na esperança média de vida faz com que seja necessário garantir durante mais tempo o pagamento da reforma.
A melhoria registada na taxa de desemprego é um fator que alivia a pressão exercida sobre o sistema. O desemprego penaliza a segurança social de várias formas, uma vez que existem menos pessoas a trabalhar e a contribuir e aumenta os encargos com subsídios de desemprego e outras prestações sociais. Em muitos casos, estes apoios sociais podem desincentivar a procura de um novo trabalho.
Em Portugal, o sistema de repartição funcionou bem enquanto se verificou um crescimento estável entre as gerações. Atualmente, dados os problemas registados a nível demográfico, levanta-se a possibilidade de se passar para um sistema de capitalização.
O Chile é considerado como o caso de maior sucesso num processo de transição de um sistema de repartição para um sistema de capitalização. O regime de capitalização contrasta com o de repartição principalmente por estabelecer uma relação individual entre as contribuições e os benefícios. As contribuições realizadas por um indivíduo durante a sua vida ativa são incluídas numa conta individual que é capitalizada ao longo do tempo, transformando-se numa pensão no momento de reforma. O risco associado a este sistema corresponde ao risco dos investimentos no mercado financeiro.
Outro exemplo de sucesso é o sistema misto adotado pela Suécia. Os modelos mistos combinam caraterísticas do modelo de repartição e do modelo da capitalização. Neste caso, o sistema de repartição tem como principal objetivo estabelecer um valor para uma pensão mínima, que luta contra os casos de pobreza.
Os custos de transação são um fator que dificultam a passagem de um sistema para o outro. Numa situação de transição seria necessário a existência de recursos suficientes para garantir o pagamento das reformas às pessoas que se encontram aposentadas e para além disso era importante ter em conta todos os descontos já realizados pelos trabalhadores, tendo necessariamente de ser compensados mais tarde. 
Atualmente, esta temática já não é tão debatida pois as medidas que foram instauradas conseguiram resolver alguns problemas que mais atormentavam a sustentabilidade da segurança social. Apesar do envelhecimento levantar preocupações económicas importantes, todos queremos viver mais e com qualidade e, por isso, encarar o envelhecimento como sendo o monstro das sociedades modernas é uma atitude um pouco sarcástica. Hermann Melville disse: “Saber envelhecer é a obra-prima da sabedoria e um dos capítulos mais difíceis na grande arte de viver”. Assim, conclui-se que é importante garantir um Estado social que consiga satisfazer as necessidades da população, e garantir que toda a sabedoria que acompanha a velhice é preservada e transmitida. 

Patrícia Daniela Ribeiro Fertuzinhos

 [artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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