domingo, 13 de novembro de 2016

E os clientes, Galp?

Antes de entrarmos a fundo nos livros de Economia a tentar desvendar termos e definições, o senso comum deste (e de provavelmente muitos outros) cidadãos é que quando uma empresa aumenta os seus lucros o primeiro recompensado deve ser o cliente, pois sem clientes não existe empresa. Assim é caso para questionar: então e os clientes, Galp?
A titularidade dos contratos de take or pay celebrados nos anos ’90 entre a Galp, a Argélia e a Nigéria permitiu à Entidade Reguladora dos Serviços Energéticos (ERSE) anunciar recentemente a estimativa de ganhos comerciais da Galp Energia, que no período entre 2010 e 2026 rondam os 1.158 milhões de euros. Estes contratos permitiram que os lucros da Galp disparassem pois obrigam o cliente (neste caso a Galp) a comprar uma quantidade mínima pré definida de gás.
Na altura da celebração destes contratos previa-se que grande parte da produção de eletricidade em Portugal fosse fornecida através de centrais de ciclo combinado (que usam gás natural), mas a progressão tecnológica da produção renovável e o fracasso do mercado do carbono deixaram a Galp com níveis de excedentes altos.
As oportunidades surgem nas alturas mais incertas e aquilo que parecia ser um problema para a empresa tornou-se numa fantástica oportunidade de negócio: a criação de excedentes coincide com a valorização do gás natural, e com o acidente de Fukushima em 2011, que fez com que países como a Alemanha e o Japão congelassem a produção de eletricidade a partir de centrais nucleares, substituindo-a por gás.
Apesar da valorização deste combustível, a Galp continuou durante anos a lucrar com este negócio, sem grandes alterações àqueles que fazem todos os dias possível a existência da empresa: os clientes. A ERSE teve acesso aos contratos de take or pay apenas em setembro deste ano, o que significa que, na altura da redação deste artigo, em 2 meses chegou ao valor exorbitante de lucros da Galp. Ironicamente, a Galp já respondeu afirmando que “(…) desconhece os dados que a ERSE utilizou para o cálculo de estimativas de potenciais ganhos acumulados até 2026 (…)” e que “Com os elementos de que a Galp dispõe, a projeção de potenciais ganhos divulgada pela ERSE não tem qualquer adesão com a realidade”.
Estes contratos são públicos e sabe-se que a Galp lucrou bastante com a oportunidade de negócio que surgiu, por isso este cidadão tem apenas que questionar: não tem a Galp obrigatoriedade de recompensar os seus clientes por este aumento de lucros? Deve o estado intervir quando esta situação acontece?

António Melo

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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