quarta-feira, 2 de novembro de 2016

O endividamento das famílias portuguesas

Ao longo dos últimos anos tem-se verificado o rápido crescimento do endividamento das famílias nas economias ocidentais. Portugal seguiu também essa tendência e foi um dos países que registou um crescimento mais acentuado. Os níveis de endividamento passaram de pouco mais de 18%, em 1990, para 130% do rendimento disponível em 2007.
O forte crescimento do endividamento dos particulares refletiu o ajustamento do comportamento das famílias e das instituições de crédito às alterações ocorridas tanto do lado da oferta como do lado da procura. Do lado da oferta, a liberalização e a desregulamentação do sistema bancário português, e o consequente aumento da concorrência no mercado de crédito, levaram as instituições financeiras a apostar no segmento do crédito a particulares. Do lado da procura, a alteração dos hábitos de consumo, a acentuada quebra nas taxas de juros nominais e reais, o aumento do rendimento disponível e a contenção do desemprego estimularam, por sua vez, a procura de crédito por parte dos indivíduos.
Com a facilidade de acesso ao crédito, as famílias viram na contração de empréstimos uma oportunidade de fazer face às suas necessidades. Esta antecipação de rendimentos proporcionada pelo crédito ajudava o consumo de determinados produtos que de outra forma demoravam bastante tempo para adquirir, como é o caso da compra da habitação ou da compra de automóvel.
Apesar de o endividamento poder ser uma oportunidade para os indivíduos adquirirem bens no imediato, é importante que façam uma gestão adequada das suas dívidas para evitar possíveis situações de incumprimento.
 Assim, o endividamento torna-se um problema quando o devedor não consegue saldar as suas dívidas em tempo útil. Esta incapacidade de honrar os seus compromissos é motivada frequentemente pela má gestão de recursos, ausência de educação financeira e maus investimentos, doença prolongada, divórcio e, principalmente, pelo desemprego e deterioração das condições de trabalho.
A crise económica que se fez sentir em Portugal, o constante aumento do desemprego, da carga fiscal e da instabilidade política, económica e social, fez disparar o nível de incumprimento dos compromissos dos particulares. Muitas vezes, para não deixarem de pagar as suas prestações, os indivíduos voltam a recorrer novamente ao crédito, acabando por entrar num ciclo vicioso do qual não conseguem sair.
A rutura financeira das famílias apresenta consequências muito graves para a qualidade e sustentabilidade da vida familiar e para o desempenho económico e social dos indivíduos e da própria sociedade. O sobre-endividamento tem também implicações importantes a nível social e psicológico, nomeadamente a marginalização e a exclusão social, os problemas psíquicos, o alcoolismo, a dissolução das famílias e as perturbações da saúde física e mental dos filhos das famílias sobreendividadas.
Com o aumento das famílias incapazes de cumprir os seus compromissos financeiros e com o receio de um eventual corte nos seus rendimentos futuros, verifica-se uma diminuição das despesas de consumo privado, especialmente de bens duradouros.  Esta redução do consumo, aliada às crescentes taxas de desemprego, diminuição do rendimento disponível e ao próprio endividamento do país, não permite que haja crescimento económico.

Francisca Fernandes

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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