sábado, 7 de abril de 2012

Crédito ao consumo em Portugal

A palavra crédito deriva das palavras latinas credere, “confiança” e creditum, “uma coisa de boa fé”. Trata-se, portanto, de uma soma em dinheiro disponibilizada por uma pessoa, uma entidade financeira ou um banco, por um determinado período de tempo. O beneficiário deve pagar uma forma de remuneração, designada por juro, como contrapartida da disponibilização do dinheiro. Implica, geralmente, a prestação de uma garantia ao banco, pela quantia emprestada. O crédito ao consumo, geralmente, dispensa esta garantia e consequentemente implica uma taxa de juro mais elevada. 
Por definição, consumo é a utilização, gasto ou aplicação de algum produto ou serviço, por um indivíduo (ou empresa) para suprir as suas necessidades. Ou seja, é o acto ou efeito de consumir. O consumo é um fenómeno social complexo condicionado por diversos factores e com influência sobre os indivíduos. Desde há muito que se sabe que as necessidades dos seres humanos obedecem a uma hierarquia, isto é, estão dispostas segundo graus de importância e de influência, numa pirâmide, onde, na sua base se encontram as necessidades fisiológicas (mais baixas) e, no topo, as necessidades de auto-realização (mais altas). 
Quando se recorre ao crédito está implícito um compromisso a longo prazo, e no caso do crédito ao consumo, deve-se proceder de forma a que o orçamento familiar não se desmorone durante o prazo em que o crédito durar, uma vez que esse crédito implica o pagamento de uma taxa de juro e, por essa razão, deve-se pensar cuidadosamente antes de contrair um crédito. Há pouco mais de dez anos não se ouvia falar em crédito ao consumo. O crédito que os portugueses conheciam era o crédito para a compra de casa e apenas alguns mais bem informados e próximos das instituições financeiras sabiam da possibilidade de utilizarem um crédito para fins privados. O crédito ao consumo é pois uma realidade recente entre nós. 
O facto é que, hoje em dia, somos “bombardeados” com publicidade, quer através da televisão, quer através da rádio, revistas, internet e até mesmo um simples panfleto que aceitamos na rua. A publicidade feita pelas diferentes empresas tem como objectivo estimular o consumo, motivar, encantar e seduzir aqueles aos quais ela se dirige, através da criação de novas necessidades, com o fim de assegurar a venda de novos produtos postos no mercado. Assim, a função da publicidade é “vender um produto, aumentar o consumo e abrir mercados”, dado que, em cada anúncio vendem-se “estilos de vida, sensações, emoções, visões do mundo, relações humanas, sistemas de classificação, hierarquias em quantidades significativas”. É devido a esta poderosa influência que os media têm na vida de cada consumidor que, muitas vezes, algumas pessoas são incitadas a evidenciar um nível de vida contrário ao seu orçamento familiar. O domínio da publicidade é tão grande que o ser humano não tem condições de optar pelo que consome e o que não precisa de consumir e, por incrível que pareça, até mesmo o consumidor consciente não está isento dos efeitos deste fenómeno global. 
Também a televisão impôs o audiovisual como uma realidade central da cultura e do quotidiano de larguíssimas camadas da população e, devido ao facto de ser um meio de informação e um instrumento lúdico, esta, por sua vez, influencia a vida dos cidadãos, delineando-lhes as crenças e os valores. Pelas suas características, condiciona o espectador a ter uma atitude de observação passiva das mensagens que recebe. 
De salientar que grande parte da nossa sociedade para quebrar o vazio que tem dentro de si “mergulha” no consumo exagerado como remédio para esse mesmo vazio. Por outro lado, também as novas tecnologias impulsionam a sociedade a consumir pois, tal como a publicidade, criam novas necessidades, levando muitas vezes as pessoas a recorrer ao crédito. O que antes era “topo de gama”, hoje já não o é, pois vivemos numa sociedade onde a tecnologia está numa constante renovação. Actualmente, existem telemóveis, computadores, ipod’s, ipad’s, entre outras, que antigamente eram impossíveis de imaginar. É devido a esta evolução tecnológica que a sociedade vai querendo cada vez mais e de melhor qualidade, habituando-se a padrões de vida elevados. Por estes motivos, as pessoas querem estar sempre actualizadas comprando sempre o que “está na moda”, e, para tal, recorrem ao crédito com bastante frequência, com o objectivo de satisfazer as suas necessidades supérfluas. 
 A expansão dos centros comerciais é outro dos factores que influência o crédito ao consumo, já que com a evolução das grandes superfícies comerciais verifica-se uma grande difusão das redes de franchising e também o comércio electrónico, onde as contas são geralmente liquidadas através do cartão de crédito. É, então, com os grandes centros comerciais que se começa a usar técnicas de marketing que vão desde as campanhas de preços a outras formas mais sofisticadas de promoção de vendas, fazendo apelo aos valores privilegiados pelos consumidores. O espaço comercial é hoje comparado a um espaço de lazer, de convívio e de cultura. Existe, portanto, o cuidado das lojas com a sua parte estética, o simbolismo do próprio centro, as preferências e disponibilidades dos consumidores, que passaram a aliar a tarefa de comprar ao passeio de fim-de-semana. Também a modernização do comércio, assim como a flexibilização dos horários, animação e remodelação das lojas, constitui uma atracção para o aumento do consumo. Muitas destas lojas têm-lhes associado um cartão de crédito especial, utilizado como instrumento de fidelização de clientes, criando, desta forma, uma atracção à compra por impulso, à compra como distracção. 
 Todavia, também a facilidade de acesso ao crédito cria um forte aumento da procura do crédito ao consumo, devido à diminuição das taxas de juro e à grande influência das campanhas publicitárias para a cedência de crédito. Facilmente podemos concluir que a publicidade transmite a ideia de que o crédito não é caro e que é de fácil acesso, podendo contribuir para o sobreendividamento dos portugueses. 
 Um dos aspectos que a realidade social tem vindo a evidenciar nos últimos tempos, traduz-se na criação de estímulos orientados no sentido de levar os particulares à aquisição de bens e serviços. Assiste-se, então, ao aumento progressivo do crédito para fins de consumo e consequentemente a uma acentuada diminuição do rendimento disponível das famílias, um pouco também por culpa do aumento do desemprego e instabilidade do mesmo. É então neste âmbito que surge o fenómeno do sobreendividamento – designado por insolvência ou falência dos consumidores, correspondendo a situações em que o devedor dos créditos se vê impossibilitado de pagar o conjunto das suas dívidas. Concluo ser este um problema que atinge a maior classe social do país e cuja justificação não se encontra tanto na necessidade extrema de aquisição de bens para sobrevivência, mas sim na má gestão orçamental dos rendimentos familiares. É, pois, um problema de educação que terá de ser resolvido antes que se chegue ao ponto de ruptura económica. É urgente mudar as mentalidades dos nossos consumidores.

Catarina Fernandes


[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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