A culpabilização do actual
sobre-endividamento das famílias portuguesas é um debate cansado e infrutífero.
Se, por um lado, a banca é culpada por se submeter a riscos excessivos
concedendo crédito prodigamente às famílias; por outro lado, os particulares
não se eximem por perpetuarem hábitos de consumo bem acima das suas
possibilidades, quer por irresponsabilidade, quer por ignorância.
Actualmente, é consensual que o
esforço de ajustamento terá que ser levado a cabo por ambos e as lições da
crise estão à vista de quem as quiser aprender. É hoje manifesto que as
decisões dos consumidores nos mercados bancários têm inegáveis repercussões na
estabilidade macroeconómica e financeira, mas desresponsabilizá-los por
desconhecerem o risco das suas decisões ou inculpar o sector bancário pela
ligeireza com que concedeu crédito aos particulares está longe de ser a
solução.
Num cenário de bancos
descapitalizados e o crédito malparado a atingir valores inéditos, é altura de
unir esforços e aprender com os erros. Os primeiros sinais de uma mudança de
rumo começam a emergir no sector bancário: à premência da desalavancagem
forçada acresce o facto das campanhas voltadas para a massificação do crédito
ao consumo terem vindo a ser substituídas por outras de captação das poupanças
individuais através, por exemplo, dos planos poupança-reforma.
Valorizar a cultura de poupança é
amiúde constante nos discursos políticos e a sua importância é sobejamente
conhecida. Mas num contexto de crescente diversidade e complexidade dos
produtos financeiros disponíveis, são também crescentes as competências e os
conhecimentos específicos exigidos aos consumidores na sua tomada de decisões
financeiras.
O primeiro (e, até à data, o
único) inquérito à literacia financeira da população portuguesa, conduzido pelo
Banco de Portugal em 2010, colocou em evidência alarmantes deficiências na
sensibilidade face à importância de poupar e no conhecimento da população
relativamente a questões financeiras.
Estima-se que apenas 52% da
população mantém hábitos de poupança. Destes, apenas 20% poupa numa lógica de
médio e longo prazo numa conta a prazo ou noutra aplicação financeira, enquanto
que 54% considera como poupança o dinheiro deixado numa conta à ordem para
gastar mais tarde. Somado à iminente falência do esquema de aposentações da
Segurança Social, é evidente a receita para o desastre.
Ainda mais inquietante é a
cegueira com que a população portuguesa gere as suas poupanças e recorre ao
crédito. Do inquérito supracitado, 69% dos inquiridos desconhece a taxa de juro
aplicada às suas poupanças e 65% ignora as taxas de juro aplicáveis aos seus
empréstimos. Em adição, apenas 9% dos inquiridos afirma saber o conceito de
Euribor e 17% o significado do spread
que incide sobre uma taxa de juro de referência.
Aliado ao facto da maioria dos
inquiridos analisar a informação pré-contratual (83%), mas apenas 8% comparar
produtos, torna-se patente a debilidade da tomada de decisões financeiras dos
cidadãos portugueses. A conclusão não oferece qualquer resistência: a
informação não é suficiente, é necessário educação.
A aposta na literacia financeira
irá munir os cidadãos das ferramentas necessárias para recorrerem ao crédito de
uma forma sóbria e consciente dos riscos inerentes, e sensibilizará para a
necessidade de poupar, contribuindo para uma conjuntura económica mais estável,
maior autonomia face à Segurança Social e reduzindo a pressão sobre a despesa
pública.
Neste sentido, torna-se
imperativo acrescentar a literacia financeira como um dos vectores prioritários
do ensino regular. A implementação de uma estratégia nacional de educação
financeira passa pela inclusão desta temática no currículo escolar, seja com
autonomia disciplinar ou inserida em disciplinas pré-existentes.
Assim, confirmado o facto da
iliteracia financeira portuguesa ter sido um dos determinantes do actual
enquadramento económico e social, falta apenas o reconhecimento, por parte das
instituições competentes, da educação financeira como um alicerce
imprescindível ao crescimento sustentável do país.
Pedro Nuno Loureiro Afonso da
Rocha Armada
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