sábado, 7 de abril de 2012

A Importância da Literacia Financeira

A culpabilização do actual sobre-endividamento das famílias portuguesas é um debate cansado e infrutífero. Se, por um lado, a banca é culpada por se submeter a riscos excessivos concedendo crédito prodigamente às famílias; por outro lado, os particulares não se eximem por perpetuarem hábitos de consumo bem acima das suas possibilidades, quer por irresponsabilidade, quer por ignorância.
Actualmente, é consensual que o esforço de ajustamento terá que ser levado a cabo por ambos e as lições da crise estão à vista de quem as quiser aprender. É hoje manifesto que as decisões dos consumidores nos mercados bancários têm inegáveis repercussões na estabilidade macroeconómica e financeira, mas desresponsabilizá-los por desconhecerem o risco das suas decisões ou inculpar o sector bancário pela ligeireza com que concedeu crédito aos particulares está longe de ser a solução.
Num cenário de bancos descapitalizados e o crédito malparado a atingir valores inéditos, é altura de unir esforços e aprender com os erros. Os primeiros sinais de uma mudança de rumo começam a emergir no sector bancário: à premência da desalavancagem forçada acresce o facto das campanhas voltadas para a massificação do crédito ao consumo terem vindo a ser substituídas por outras de captação das poupanças individuais através, por exemplo, dos planos poupança-reforma.
Valorizar a cultura de poupança é amiúde constante nos discursos políticos e a sua importância é sobejamente conhecida. Mas num contexto de crescente diversidade e complexidade dos produtos financeiros disponíveis, são também crescentes as competências e os conhecimentos específicos exigidos aos consumidores na sua tomada de decisões financeiras.
O primeiro (e, até à data, o único) inquérito à literacia financeira da população portuguesa, conduzido pelo Banco de Portugal em 2010, colocou em evidência alarmantes deficiências na sensibilidade face à importância de poupar e no conhecimento da população relativamente a questões financeiras.
Estima-se que apenas 52% da população mantém hábitos de poupança. Destes, apenas 20% poupa numa lógica de médio e longo prazo numa conta a prazo ou noutra aplicação financeira, enquanto que 54% considera como poupança o dinheiro deixado numa conta à ordem para gastar mais tarde. Somado à iminente falência do esquema de aposentações da Segurança Social, é evidente a receita para o desastre.
Ainda mais inquietante é a cegueira com que a população portuguesa gere as suas poupanças e recorre ao crédito. Do inquérito supracitado, 69% dos inquiridos desconhece a taxa de juro aplicada às suas poupanças e 65% ignora as taxas de juro aplicáveis aos seus empréstimos. Em adição, apenas 9% dos inquiridos afirma saber o conceito de Euribor e 17% o significado do spread que incide sobre uma taxa de juro de referência.
Aliado ao facto da maioria dos inquiridos analisar a informação pré-contratual (83%), mas apenas 8% comparar produtos, torna-se patente a debilidade da tomada de decisões financeiras dos cidadãos portugueses. A conclusão não oferece qualquer resistência: a informação não é suficiente, é necessário educação.
A aposta na literacia financeira irá munir os cidadãos das ferramentas necessárias para recorrerem ao crédito de uma forma sóbria e consciente dos riscos inerentes, e sensibilizará para a necessidade de poupar, contribuindo para uma conjuntura económica mais estável, maior autonomia face à Segurança Social e reduzindo a pressão sobre a despesa pública.
Neste sentido, torna-se imperativo acrescentar a literacia financeira como um dos vectores prioritários do ensino regular. A implementação de uma estratégia nacional de educação financeira passa pela inclusão desta temática no currículo escolar, seja com autonomia disciplinar ou inserida em disciplinas pré-existentes.
Assim, confirmado o facto da iliteracia financeira portuguesa ter sido um dos determinantes do actual enquadramento económico e social, falta apenas o reconhecimento, por parte das instituições competentes, da educação financeira como um alicerce imprescindível ao crescimento sustentável do país.

Pedro Nuno Loureiro Afonso da Rocha Armada

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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