sábado, 7 de abril de 2012

O futuro da classe média

No século XX, o sonho americano da vida de uma classe média inspirou o mundo. Agora, no século XXI, estamos a caminhar, a alta velocidade para um mundo baseado numa nova geografia de crescimento, com milhões de pessoas no este e no sul do globo a afastarem-se da pobreza extrema e a tornarem-se, possivelmente, em poderosos consumidores da classe média. Agora, se o sonho de uma nova classe média global se torna realidade ou se transforma num pesadelo vai depender, certamente, de muitos fatores.
No atual mundo em mudança na qual vivemos com o PIB de, aproximadamente, 80 economias em desenvolvimento a duplicar o ritmo de crescimento per capita da OCDE, o clube dos países mais ricos do globo, os cidadãos da classe média estão, de modo paradoxal, a queixarem-se e a protestarem, independentemente das suas riquezas estarem a crescer ou, pelo contrário, a diminuir. Até há quem alerte para uma possível emergente guerra global de classes médias. Ao passo que a raiva causada pelos cortes e pelo desemprego faz sentido, é difícil de perceber os atuais protestos em países em rápido crescimento como, por exemplo, a Tailândia, onde os padrões de vida estão a melhorar. Posto isto, podemos perguntar: o que está a acontecer?
O elevado crescimento em países da Ásia e do sul do globo significa maiores receitas com exportações e maiores receitas alcançadas com os seus recursos naturais. Infelizmente esta bênção pode tornar-se numa “maldição”. Na realidade, é importante salientarmos, por exemplo, que, na China, as autoridades municipais de Pequim proibiram todos os anúncios de produtos luxuosos em cartazes de rua que podiam contribuir para um “ambiente político pouco saudável”.
Uma contínua desigualdade, ausência de participação cívica, inatividade política e escassez de bons empregos, particularmente para os mais jovens formam o “calcanhar de Aquiles” do modelo atual de desenvolvimento dos países emergentes. Embora em alguns países os níveis de rendimento e as condições sociais tenham melhorado, a satisfação com a vida caiu.
A classe média, atualmente, representa dois mil milhões de pessoas, divididas quase uniformemente entre economias desenvolvidas e emergentes. A OCDE estima que, em 2030, a classe média global poderá ascender a 4,9 mil milhões. Destes, entre 3,2 e 3,9 milhões de pessoas estarão talvez a viver em economias emergentes, representando cerca de 65% a 80% da população global. Estas pessoas vão exigir mais e melhores serviços, uma divisão mais justa dos benefícios trazidos pelo crescimento e instituições políticas mais adequadas.
A recente onda de protestos a que temos assistido pode ser o início desta tendência. A maior parte da classe média emergente está apenas a uma alteração no salário para regressar novamente à pobreza. Para combater este risco, os programas de segurança social devem ser gradualmente prolongados para lá da assistência social.
A meu ver, outro ponto a salientar é que mais empregos são desesperadamente necessários. A educação no mundo em desenvolvimento tem de sofrer uma reforma para responder à procura por qualificação. É essencial, também, um contrato social que implique melhores serviços e uma maior prestação de contas dos governos para melhorar a política orçamental e para mobilizar os recursos domésticos. Em países cujas populações são genuinamente livres e onde beneficiam de serviços públicos de boa qualidade, a confiança social aumenta e os cidadãos estão mais dispostos a pagar impostos. O contrário acontece em Portugal. Nos países onde as pessoas não confiam umas nas outras, mais de um terço da população considera que a evasão fiscal é aceitável. Este valor desce para um décimo no caso das nações onde as pessoas confiam umas nas outras.
A ascensão da classe média global vai transformar a “paisagem” social, política e económica de todo o mundo. A ascensão de sociedades coesas, em que as pessoas se sintam protegidas, em que os cidadãos confiem uns nos outros e em que os esforços sejam recompensados é a chave para a concretização dos sonhos dos seus membros.

Elsa Lopes

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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