Em
primeiro lugar, gostaria de começar esta minha crítica por dizer que, não raras
vezes, sou confrontado com títulos jornalísticos, que expõem determinadas problemáticas
da esfera económica nacional, cujo teor me deixa completamente perplexo e
atónito. Com efeito, e tendo em conta a temática sobre a qual versa este meu
comentário, apraz-me dizer que, nos últimos tempos, de entre toda uma panóplia
de cabeçalhos socialmente acutilantes, houve um que registei com particular
atenção: “Trabalhadores de empresas públicas reclamam excepções”. A primeira
dúvida que me assola é a seguinte: será possível que uma qualquer empresa ou
até cidadão coloque sequer a hipótese de reclamar uma excepção aos cortes
salariais anunciados pelo Governo, como que reivindicando uma espécie de regime
especial, numa altura tão difícil para o país, em que tantos sacrifícios são
pedidos a todos os portugueses? Pelos vistos é. Senão, vejamos o caso da TAP e
da CGD.
Num
contexto europeu marcado pela crise da dívida soberana, em que Portugal , face à
dificuldade de se financiar nos mercados internacionais a taxas de juro
compatíveis com a manutenção do défice externo sob controlo, se viu obrigado a
recorrer a um pacote de ajuda financeira externa disponibilizado pela U.E. e
pelo F.M.I., aplicando, como moeda de troca, um programa de ajustamento
estrutural da economia que, entre outros pontos, visa uma redução significativa
do défice público, nomeadamente, recorrendo a medidas de austeridade (aumento
generalizado de impostos, cortes salariais, cortes nos subsídios de férias e de
Natal, etc.), considero inaceitável que, tanto a TAP, como a CGD, duas empresas
com participações do Estado, reivindiquem um regime de exclusividade
relativamente às demais empresas (quer estas sejam de capital público ou
privado) no que à questão dos cortes salariais diz respeito. Contudo, no meu
entender, maior afronta aos cidadãos constitui a posição do Estado ao conceder,
quer à TAP, quer à CGD, um regime de excepção, tal como pretendido, ignorando,
desta forma, a meu ver, o direito à igualdade de todos os contribuintes
portugueses.
Ainda sobre os contribuintes e a
gestão, por parte do Estado, do dinheiro que estes pagam em impostos, gostaria
de tecer uma última consideração no que concerne à política de privatizações de
empresas públicas levada a cabo pelo Governo, em linha com o programa de
ajustamento estrutural, com o intuito de arrecadar receitas extraordinárias
para amortização do défice. Neste âmbito, sabendo que o Estado alienou 21,35%
do capital da EDP, 40% do capital da REN e 7% do capital da Galp Energia,
entendo que, numa fase de necessidade de realizar receita urgentemente e, como
tal, sem grande margem de manobra para negociar com os interessados, o Estado
efectuou um mau negócio, logo, saiu a perder, isto é, todos nós saímos a
perder. Como curiosidade fica o facto de que, se tivesse mantido a sua posição
na EDP e na REN, o Estado teria encaixado uma verba de aproximadamente 180
milhões de euros com remunerações accionistas.
Em jeito de nota final, gostaria de
deixar clara a minha opinião acerca das várias tomadas de posição por parte do
Governo no que toca à abertura de determinadas excepções para algumas empresas.
Assim, considero um comportamento ou acção extremamente grave, essa, a do
Governo, de conceder regimes de excepção à TAP e CGD, uma vez que penso que a
abertura de excepções num contexto de crise constitui, claramente, uma prática
lesiva para a restante população portuguesa que paga os seus impostos e que,
ainda assim, não tem direito a determinadas regalias que outros, por sua
condição de estarem inseridos numa empresa que está destinada a ser
privatizada, ou que opera num mercado concorrencial, lhes vêem ser atribuídas.
Mais, penso até que constitui uma manobra fracturante da coesão social
portuguesa, uma vez que viola, indubitavelmente, o princípio da igualdade do
cidadão. No entanto, é de realçar que a população portuguesa acatou mais uma
afronta deste calibre de modo pacífico, se calhar, demasiado pacífico.
Tendo
isto em mente, e visto pensar que atribuição de um regime especial a um
determinado conjunto de privilegiados, uma elite, descurando todos os outros
contribuintes, constitui uma das ofensas mais graves de um regime democrático
para com a sua população, dou por mim a pensar que, para o bem e para o mal,
não somos como a Grécia, porque se fôssemos...
Nuno Ferreira
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