Não destoando da realidade actual, a Islândia foi também um país a
ser afectado pela crise desde 2008. No entanto, não seguiu o caminho de
Portugal no que toca à resolução de problemas internos – dispensaram a ajuda da
Troika, acreditando que era possível
alterar o cenário de pobreza e desemprego através da união e da reestruturação
dos líderes e do poder. A falência de bancos, o aumento da inflação e dos
empréstimos, a perda de valor dos salários, a desvalorização das habitações, um
aumento substancial da taxa de desemprego e a falência de metade das empresas
acordou o país para uma nova realidade.
A decisão de mudança de hábitos e alteração de leis foi
maioritariamente tomada pela própria população, que, não conformada com o
desenrolar das políticas e das medidas que vigoravam, tentou remediar a
situação pelas próprias mãos. A revolução social iniciou-se logo em 2008 e
exigiu sobretudo uma democracia transparente e soluções para as questões que
abalavam o país. Para tal, vinte e cinco cidadãos foram eleitos para reescrever
a Constituição da Islândia e foi realizada uma reunião geral do povo com cerca
de mil representantes que foram escolhidos para debater os valores que criam
ajudar o país a sair da crise. Foram realizadas investigações a banqueiros e a
membros do Estado para apurar as incompetências e as fragilidades, acusar os
corruptos e procurar novos líderes capazes de controlar a situação. Cortou-se
nas importações, privilegiou-se o consumo de bens nacionais, de bens em 2ª mão
e de marca branca e incentivou-se a produção de bens alimentares pelas
famílias. As actividades de lazer foram ‘cortadas’ dos planos familiares e as
próprias habitações sofreram alterações a nível funcional e energético de modo
a poupar ao máximo.
O empréstimo negociado do FMI e os
empréstimos bilaterais da China e da Polónia foram as únicas ajudas externas
que a Islândia obteve na altura. Segundo o director do departamento de Economia
da Universidade de Reykjavik, o FMI
“impôs uma redução do défice, mas
não estabeleceu condições para os cortes. Isso acontece, talvez, porque o FMI
não tem de convencer o eleitorado, como tem a chanceler alemã”. Foram tomadas
diferentes medidas de emergência, tais como a obrigação de informação ao Banco
Central de grandes empréstimos bancários; o término da aplicação do imposto
único, sendo criados novos escalões; os salários dos administrativos dos bancos
foram tornados públicos; foram impostos limites de bónus a gestores e crédito
de familiares e amigos de administradores de bancos. Uma das várias leis
aplicadas foi a da facilidade de pagamento de empréstimos em moeda estrangeira,
dando três meses às "instituições financeiras para converterem os
empréstimos em divisas, de acordo com as taxas de juro publicadas pelo Banco
Central da Islândia". A desvalorização da coroa islandesa contribuiu
também para o aumento das exportações, que, aliada à redução das importações,
revelou uma melhoria na Balança Comercial do país.
As decisões que vieram a ser tomadas
até hoje reflectiram-se num notável crescimento económico, embora haja ainda
fragilidades que têm de ser colmatadas. Apesar de ainda haver um longo caminho
a percorrer, a Islândia é a prova viva que a insurgência do povo contra a
corrupção e as desigualdades sociais pode revelar-se essencial para a mudança
de rumo que muitos países, incluindo Portugal, estão a seguir. A diferença de
mentalidades entre islandeses e portugueses verifica-se quando os últimos são
muito mais conformistas e relaxados em relação a situações que não seriam, de
todo, indiferentes aos outros. Mostraram que é possível revolucionar o sistema,
desafiar o Governo e os Bancos e toda a massa elitista que os controla.
Embora tendo negociado um empréstimo
com o FMI, a Islândia não permitiu que o controlo que hoje é exercido em
Portugal fosse determinante para a alteração dos comportamentos do país – em
vez disso, deixou que a própria população ditasse o modo como deveria ser
regido. Na minha opinião o caso da Islândia deveria ser muito mais comentado
pelos media de forma a dar esperança
e mostrar ao nosso país que, através de uma revolução inteligente e pensada,
seria possível alterar o caminho que nos está traçado. Embora a Islândia tenha
um longo caminho a percorrer, a mudança interna que se deu já desde 2008
permitiu que houvesse mais confiança e transparência num sistema que,
claramente, não resultava até ao dia que perceberam que o país tinha de mudar.
Adriana Isabel Carneiro Morais de
Sousa
Sem comentários:
Enviar um comentário