quinta-feira, 19 de novembro de 2020

Já não é suficiente dizer “vai ficar tudo bem”

      É impossível negar que a pandemia provocada pelo coronavírus representa um desafio sem igual na vida da população mundial. Tudo mudou com a chegada deste inimigo invisível, e a acompanhar essa mudança deve estar a nossa relação com o setor da saúde.

O Serviço Nacional de Saúde (SNS) constitui um sistema através do qual o Estado Português assegura o direito à saúde a todos os cidadãos do país, independentemente da condição económica e social de quem dele beneficia.

Em todo o país se multiplicam relatos de falhas neste sistema. No entanto, perante esta situação, continua a verificar-se a degradação dos edifícios e equipamentos, a emigração de pessoas especializadas na área da saúde não diminui, as listas de espera aumentam e a despesa do Estado em saúde, em percentagem do PIB, tem vindo a diminuir desde 2012, onde atingiu um pico de 6,2%. Em 2018, situou-se nos 4,3%. Contudo, na realidade, o sistema de saúde português fica sempre bastante bem posicionado quando comparado com outros sistemas de saúde. 

Suponho que todos prevemos que, devido à situação pandémica que o mundo vive, iremos observar o maior acréscimo de despesa no SNS de que há memória. O orçamento da saúde vai crescer mais de 700 milhões face à estimativa de execução de 2020, de acordo com o relatório do Orçamento do Estado para 2021. O reforço orçamental, positivo e necessário, tem como objetivo  melhorar a capacidade de resposta do SNS, reforçar este sistema e controlar a pandemia em Portugal.

No entanto, é preciso evidenciar que o facto de se gastar mais em saúde nem sempre repercute em melhores resultados obtidos (como mencionado pela OCDE). É necessário ter a avidez de fazer uma aposta estratégica de desenvolvimento neste setor e, tendo em conta a situação pandémica, ainda mais.  Mas mais dinheiro não trará mais proveito para a população se for desperdiçado, nem trará uma solução miraculosa para todos os problemas do SNS. É fundamental reconhecer os problemas e as suas causas para partir para uma solução eficaz. Considero importantíssima a organização do sistema, a gestão de serviços e a capacidade dos líderes serem, efetivamente, bons líderes. E nisto não há orçamento que ajude!

No presente ano, o governo solicitou um orçamento suplementar para fazer face à pandemia e teve-o, mas aproximamo-nos do final do ano e a pandemia ainda não está controlada, sendo que exige cada vez mais recursos ao SNS. Existem várias consultas, exames e rastreios em atraso.  Há pessoas a necessitar de cuidados de saúde e a não ter acesso a eles por falta de resposta do sistema devido à sobrecarga do mesmo causada pela pandemia. A saúde é um direito humano fundamental e não devem existir desigualdades nem dificuldades no seu acesso.

No entanto, considero que a oportunidade para melhorar o SNS está nas nossas mãos. Possuímos recursos humanos qualificados, que são cruciais. Posto isto, apesar de considerar que o SNS necessita efetivamente de um grande investimento, não pode a população Portuguesa ajudar na manutenção da sua sustentabilidade, ainda mais, nos dias de hoje? Cabe-nos a nós acatar as normais impostas, cumpri-las com rigor e tentar impedir a progressão deste vírus.

Descontextualizando do ambiente pandémico, o envelhecimento da população e as novas tecnologias favorecem o aumento das despesas no setor da saúde. Para tentar contrariar esta evidência, considero que investimentos nos cuidados preventivos vão permitir que as pessoas vivam mais tempo, mas saudáveis durante a maior parte da sua vida, o que leva a poupanças imediatas para o SNS. Eventualmente, prevenir determinadas doenças é menos dispendioso que os possíveis gastos futuros para o seu tratamento.

Acredito ser necessário retirar a saúde dos hospitais. Consciencializar a população, investir na informação das crianças quanto a hábitos de vida saudáveis para, desta forma, reduzir o potencial de um dia serem doentes e, assim, fomentar a diminuição da despesa neste setor.

Para concluir, devemos valorizar e preservar o nosso SNS, assim como os seus profissionais, mas tendo em consideração que é necessário um investimento acrescido no setor da saúde, mesmo no pós-pandemia. Chegamos a um ponto em que dizer “vai ficar tudo bem” já não é suficiente e precisamos de ações concretas para providenciar uma melhor qualidade de vida ao povo lusitano e restabelecer a confiança dos mesmos no nosso SNS.

 

Ana Carolina Ribeiro Abreu

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia da EEG/UMinho]

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