quarta-feira, 10 de novembro de 2021

A assustadora moeda da qual depende a riqueza atual: dados pessoais

      Nunca deu por si a aceitar os termos de utilização de dados pessoais sem ler, simplesmente por uma questão de pragmatismo e rapidez? Nunca se sentiu pouco seguro na internet, mesmo que cada plataforma, app ou rede social tenha uma palavra passe diferente? Atualmente, tudo o que fazemos na internet é monetizado. Na realidade, os nossos dados pessoais são a nova moeda da qual depende a riqueza.  Atualmente, o endereço de email de um único utilizador da Internet vale cerca de 89 dólares para qualquer empresa.

Pode parecer contraditório que as empresas que operam com negócios na Internet consigam obter enormes lucros todos os anos, apesar de oferecerem serviços maioritariamente gratuitos. Na realidade, estas empresas têm crescido consistentemente nos últimos anos à medida que mais pessoas se juntam à Internet. Porquê? É o algoritmo! Sempre que nos conectamos à Internet para falar com familiares e amigos, procurar emprego, comprar produtos, jogar vídeo jogos ou obter acesso a notícias estamos a ser lucrativos para estas empresas. O que é aparentemente gratuito é, na realidade, pago através de um método alternativo: usando os dados dos utilizadores, sem que os mesmo tenham consciência disso. 

Empresas como o Google, o Facebook, Twitter, Yahoo e muitas outras mais são capazes de gerar receita. Mas como? A forma mais comum é através de publicidade. Publicidade essa que não é arbitraria, mas sim feita à medida de cada um. Nunca deu por si a falar sobre Steakhouses e quando acede a uma rede social tem imediatamente anúncios sobre onde pode comer o melhor T-Bone de Portugal? Ou, então, imagine que é um jogador de Basquetebol, e pratica com frequência este desporto. A probabilidade de comprar artigos relacionados com a modalidade é relevante. Assim, as empresas mostram-lhe os anúncios relacionados com tal. É uma forma muito mais eficaz de fazer publicidade.

De facto, isto tornou-se num negócio tão lucrativo que já existem empresas especializadas na recolha e venda dos dados para outras empresas que os possam querer comprar. Estes agentes são denominados de Data Brokers. O setor conta já com lideranças consolidadas no mercado. Axciom, Epsilon, Datalogix são exemplos dessas empresas. Os data brokers compram e vendem dados pessoais de todo tipo e em vários ramos de atuação. Assim, os dados pessoais são informação relativa a uma pessoa viva, identificada ou identificável, ou são o conjunto de informações distintas que podem levar à identificação de uma determinada pessoa. Com a revolução “data-driven economy”, em que as empresas utilizam os nossos dados pessoais de modo a gerar lucro, sem terem de nos pedir autorização. Os nossos Governos também não nos pedem consentimento. Governos esses que, perante crises, não ficam para trás e usam esses dados para nos “proteger” (ou vigiar).

Empresas e governos têm um apetite insaciável pelos nossos dados. A quantidade e variedade de dados pessoais que geramos ao longo do dia é imensa. Sobretudo atualmente, com o advento do teletrabalho, em que passamos quase 24 horas por dia conectados, aumentando o risco de ataques cibernéticos. Ao permitir que as empresas (e os governos) saibam tudo sobre nós, estamos também a permitir que estes nos ponham em caixas rotuladas e nos manipulem, deixando de lado a nossa privacidade. Privacidade é a capacidade de manter para nós próprios certas coisas do foro pessoal. Deste ponto de vista, a privacidade constitui uma necessidade humana essencial para a forma como nos relacionamos com o mundo que nos rodeia. Logo, ser privado de privacidade é desumano.

A falta de privacidade digital tem como efeito a criação de assimetrias entre as entidades e os indivíduos. Destas assimetrias resultam ameaças à liberdade, igualdade, autonomia, criatividade e até ameaças à democracia. Deste modo, a sociedade será regida pelas entidades que possuírem maior número de informação relativa a cada um de nós.

Numa era em que todos nós deixamos uma pegada digital, as organizações com uma forte cultura de proteção e privacidade de dados estarão mais preparadas para enfrentar este tipo de riscos associados à ascensão do poder através dos dados pessoais. Um mundo sem privacidade digital é um mundo perigoso! Temos de ser nós a travar isto, aliando-nos às entidades certas e sem nunca perder o sentido de responsabilidade que temos na manutenção da nossa própria privacidade.


Joana Abreu 

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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