terça-feira, 2 de novembro de 2021

IVAucher: qual será o impacto na carteira dos portugueses?

Após a subida recorde do preço dos combustíveis em Portugal e perante um descontentamento generalizado dos Portugueses face a estes preços praticados pelas gasolineiras, agravados pelo imposto indireto praticado pelo Estado sobre os mesmos (61,62% de todo o dinheiro que os portugueses gastaram a abastecer os seus veículos), o Estado português decidiu lançar o IVAucher.

O que é então o IVAucher? Trata-se de uma medida na qual os consumidores receberão um subsídio para os compensar pela subida crescente dos preços dos combustíveis nos últimos meses.

É factual que as subidas constantes dos preços dos combustíveis em Portugal tornaram esta situação incomportável para uma grande parte dos portugueses face ao custo de vida geral do país. Até ao dia 18 de outubro, em 43 semanas, o preço dos combustíveis aumentou 36 vezes. Usando os cálculos do Jornal de Negócios como base, o preço da gasolina aumentou 31 cêntimos por litro face a dezembro de 2020. Também o preço do gasóleo simples sofreu um forte aumento, tendo aumentado cerca de 26 cêntimos por litro desde o início do ano.

É sabido que a crise petrolífera mundial teve um forte impacto nestes aumentos de preço. Estamos a atravessar uma crise energética a nível global, o que tem empurrado os preços do petróleo e derivados para níveis recorde, tal como a produção de outras fontes de energia, como o gás natural, não chegam para toda a procura. A pandemia que atravessamos teve um forte impacto nesta cris, sendo que os mercados da energia estão mais apertados perante a maior procura de combustível que se está a verificar, numa altura em que a atividade económica recupera e as restrições pandémicas diminuem.

E perante este regresso à normalidade, fica difícil para os mercados responderem à respetiva crescente procura após mais de um ano e meio de produção de energia reduzida devido aos confinamentos que o mundo atravessou. Mas o preço alto dos combustíveis no nosso país não pode ser apenas justificado pela crise global. Existe também uma forte carga fiscal sobre o consumo. Segundo o Jornal Economico, no gasóleo simples, a carga fiscal em Portugal pesa 56% no preço final (1,393 euros por litro), contra os 52% registados na União Europeia (1,277 euros) e os 49% de Espanha (1,206 euros), e na gasolina 95 simples a carga fiscal em Portugal pesa 60% no preço final (1,602 euros por litro), contra os 57% registados na União Europeia (1,389 euros) e os 53% da vizinha Espanha (1,346 euros).

Apesar desta carga fiscal absurda para a realidade portuguesa, o Governo apenas tem apontado o dedo às margens de lucro das gasolineiras e petrolíferas, tendo também aprovado no Parlamento um limite nas margens nos combustíveis. Nas contas do Governo, este mecanismo permitiria a descida de nove cêntimos por litro de gasolina, e um cêntimo por litro no gasóleo.
Apesar desta medida aprovada, o descontentamento continuou generalizado na população, sendo que quase semanalmente eram organizadas manifestações de contestação. Perante este cenário, eis que surge o IVAucher, um subsídio que consiste no equivalente a 10 cêntimos por litro até 50 litros de combustível por mês (cerca de cinco euros por mês). Este subsídio, que entra em vigor a partir do dia 10 de novembro, destina-se a "todos os portugueses" com NIF (Número de Identificação Fiscal) e cartão bancário. Tal como sucede com o IVaucher da hotelaria, restauração e cultura, para haver o reembolso do subsídio é necessário que o consumidor que vai abastecer o veículo com combustível pague a conta com um cartão bancário.

O valor total do subsídio, ou seja, os cinco euros a que cada consumidor tem direito por mês, vão ser transferidos para a sua conta bancária com o primeiro abastecimento mensal, mesmo que nesse primeiro abastecimento ponha menos de 50 litros. Porém, apesar de um aparente benefício desta medida, ainda existem várias barreiras e questões no ar sobre o seu funcionamento. Primeiro, porque ainda não foi definido um valor mínimo de abastecimento. Também não se sabe ainda se também poderá abranger um possível contribuinte que não tenha acesso a um cartão bancário, sendo que o valor subsidiado é transferido para a conta bancária do cartão utilizado. O valor do subsídio também é contestado pois, face aos preços praticados, há quem defenda que os 10 cêntimos por litro, num limite de 50 litros (valor calculado tendo em base o consumo médio das famílias), corresponde a um valor irrisório e longe da realidade dos consumidores portugueses.

A falta de informação também será um entrave ao bom funcionamento da medida, pois nem todos os consumidores sabem que, para usufruírem do subsídio, terão de se registar na plataforma ivaucher.pt a partir do dia 1 de novembro. Faltam também saber se os 3.800 postos de abastecimento registados na Entidade Nacional para o Setor Energético (ENSE) vão aderir à medida, sendo que é uma decisão que caberá a cada empresa.

Entre as críticas generalizadas dou destaque à do antigo ministro das finanças, Bagão Félix, que disse em entrevista à Antena 1 e Jornal de Negócios que iVaucher é uma “história mal contada”, pois constitui uma “regressão fiscal”, que apenas beneficiará os ricos.

Para concluir, com o IVAucher, o Estado estima devolver 132 milhões de euros aos consumidores, o que na minha opinião se trata de publicidade enganosa, pois o acesso à mesma não será fácil para uma boa parte dos consumidores devido a vários fatores acima mencionados, principalmente à falta de informação sobre a sua utilização.

 

Henrique Miranda Botão Moreira

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

Sem comentários: