Ao longo das décadas de 1970 e 1980, Portugal registou taxas de poupança que excediam 20% do rendimento disponível das famílias, posicionando-se favoravelmente não só a nível europeu mas, também, mundial. A maior taxa de poupança registada durante o período mencionado foi de 27,4%, em 1982.
No seguimento da adesão à Comunidade Europeia, em 1986, o rendimento médio das famílias portuguesas aumentou, alteração acompanhada por um crescimento mais do que proporcional do consumo e por uma rápida progressão do endividamento. Em consequência da modificação da estrutura do rendimento, a taxa de poupança em Portugal, a partir da década de 1990, não voltou a ultrapassar 20%, tendo, deste então, apresentado uma tendência comportamental decrescente. A entrada no novo século ficou registada pela menor taxa de poupança até ao momento: em 2000 os portugueses apenas conseguiram poupar, em média, 12,2%.
A propensão apresentada
manteve-se nos anos precedentes à crise financeira de 2007/2008, a partir da
qual se denota alguma consciencialização relativa à atitude consumista da
população. Aquando dos primeiros sintomas da recessão, a poupança portuguesa
registou um crescimento até 2012, ano no qual a taxa de poupança alcançou 9,7%,
havendo até um pico de 11,2% em 2009. Como hipótese solucionadora da rutura das
contas públicas, foi efetuado um pedido de apoio, atendido pelo Fundo Monetário
Internacional. Assim, a capacidade evolutiva da poupança ficou limitada pela
redução dos rendimentos e dos benefícios sociais, aliada ao agravamento dos
impostos e dos preços de bens e serviços. Mediante tal ocorrência, a
vulnerabilidade financeira das famílias portuguesas aumentou, resultando no
incumprimento de pagamento de dívidas e na insolvência.
A 4 de maio de 2014 foi
anunciada a saída do programa de resgate financeiro, ano no qual Portugal
registou a menor taxa de poupança de sempre, 6,4%. Contudo, a par de algum
crescimento económico e conforto financeiro das famílias, a poupança relativa
aumentou para 7,1% em 2016, valor que, depois de um leve decréscimo, se voltou
a verificar em 2019, o ano anterior à crise pandémica no contexto português.
No
dia 2 de março de 2020 foi registado o primeiro caso de COVID-19 em território
português, catorze dias depois a primeira morte em consequência do vírus e pelo
dia 18 do mesmo mês o país já se encontrava em estado de emergência, com o
confinamento obrigatório da maior parte dos indivíduos. Lojas encerraram a atividade
por tempo indeterminado, voos eram cancelados diariamente, estabelecimentos
educacionais e outros adotaram o regime online,
o setor da restauração passou a tentar sobreviver à base do take-away. Todas
estas consequências tiveram, de alguma maneira, um impacte positivo na poupança
das famílias, uma vez que representaram um desincentivo ao consumo.
Outro fator complementar que auxiliou no crescimento da taxa de poupança foi a atitude comportamental preventiva tomada pelas famílias, em consequência da incerteza inerente a uma crise pandémica. Os últimos vestígios de um surto económico-social semelhante remetem para a gripe espanhola, cem anos antes. Assim, a taxa de poupança das famílias portuguesas, em 2020, foi de 12,6%, valor que não era excedido desde 1999 (13,2%).
Em perspetiva própria,
acredito que Portugal beneficiasse de uma alteração de mentalidade e de
hábitos. Um grande exemplo é a aquisição de habitação, prática comum dos
portugueses. Em 2014, as residências em propriedade perfaziam 74,8% do total,
ao contrário de países como a Alemanha e os Estados Unidos da América, que apresentam
situações muito mais equilibradas, havendo um quase perfeito balanço entre esse
género de habitação e a residência em arrendamento (48,1% na Alemanha e 52% nos
EUA). Esta atitude pode, com facilidade, esgotar as poupanças dos indivíduos e
até provocar o endividamento das famílias durante vários anos.
Portugal é um país de
consumos, fator que pode até estimular a economia de um país, mas só até certo
ponto. A meu ver, as famílias deveriam aproveitar a recente expansão das suas
poupanças investindo-as, o que também promoverá o desenvolvimento económico
nacional e poderá impedir o esgotamento das mesmas.
Marta Sofia Mesquita Fernandes
[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
Sem comentários:
Enviar um comentário