terça-feira, 23 de novembro de 2021

Cultura no panorama socioeconómico

       Ainda que seja difícil definir a palavra “Cultura”, creio que de uma forma abrangente podemo-nos referir à mesma como sendo uma maneira estratégica de refletirmos sobre a nossa sociedade. Isto porque engloba a Humanidade em toda a sua riqueza e multiplicidade de formas de existência, expressando as realidades dos agrupamentos humanos (sejam eles nações, povoações, etc.) e as caraterísticas que os unem e diferenciam. À vista disso, a Cultura é, a par da Educação, um pilar essencial para o desenvolvimento de qualquer sociedade.

          A preponderância da Cultura na Economia é visível em diversos indicadores macroeconómicos, tanto a nível nacional como europeu. Em 2018, segundo dados estatísticos do GEPAC (Gabinete de Estratégia, Planeamento e Avaliação Culturais), a cultura empregava mais de 160 mil portugueses, representando cerca de 3,3% do total do emprego em Portugal. Já em 2019, um outro estudo realizado pela GESAC, denominado “Reconstruir a Europa: a economia cultural e criativa antes e depois da COVID-19”, revela que o setor cultural representou 4,4% do PIB da UE, assegurando mais de 7 milhões de empregos, ficando apenas atrás da hotelaria e restauração no que toca à criação de emprego.

É reconhecido que o setor cultural foi um dos mais afetados (em conjunto com o turismo) pela pandemia, uma vez que levou ao encerramento de empresas e a uma elevada perda de empregos. Encarando o impacte negativo sofrido, e associando a sua importância socioeconómica já ponderada anteriormente, fica por demais evidente que deve ser uma área primordial à qual o Estado tem que dar atenção. No entanto, ainda que o Orçamento do Estado para 2022 tenha sido chumbado, a apresentação inicial do mesmo indicava que a cultura representava apenas 0,25% do OE (sem contar com a RTP).

Acredito que este investimento residual na Cultura deixa percetível que os policy makers continuam a ignorar o potencial do setor tanto na perspetiva económica como de desenvolvimento do indivíduo. Algo que vai de encontro à opinião dos portugueses, visto que o estudo apresentado pela plataforma independente de jornalismo “Gerador” diz-nos que, em 2021, são mais de 72% aqueles que avaliam negativamente a ação do Governo perante este setor. Adicionalmente, 85% dos portugueses é da opinião que o Orçamento do Estado para a Cultura deveria ser aumentado já a partir do próximo ano.

Na minha opinião, o aumento deste investimento deve ser uma prioridade, sendo que este pode ser notado através de diversas medidas. Uma delas é a implementação de um estatuto laboral para os profissionais da Cultura, algo que é reivindicado há mais de 20 anos, e que está previsto que entre em vigor a 1 de janeiro de 2022. Este estatuto oferece uma maior proteção social aos trabalhadores que nele se inserem através do direito à proteção nos casos de doença, parentalidade, invalidez, entre outros, ou através de subsídios, caso fiquem numa “situação involuntária de suspensão da atividade cultural”.

De forma complementar, devem ser criadas as condições ideais para que museus, companhias de teatro, cinemas, entre outros, consigam ter uma oferta qualificada e competitiva perante os outros países, investimento este que iria ter reflexo imediato em duas áreas que se refere a seguir. Uma delas é nas exportações e turismo, sendo este último considerado fundamental para a economia portuguesa. Para além disso, se o investimento no setor for cada vez mais atrativo, o aparecimento do investimento privado iria progredir de forma gradual, e cada vez menos seria necessária a intervenção do Estado.

          É certo que também podemos apontar o subdesenvolvimento do setor cultural a um problema mais intrínseco aos valores da sociedade, nomeadamente no facto de poder não enaltecer de forma satisfatória a Cultura em si, mas creio que deve ser da prioridade do Estado fazer o possível para mudar essa mentalidade, dando um salto qualitativo na construção de um futuro mais inclusivo, sustentável e humano.

 

João Mota Rodrigues

[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]   

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