quarta-feira, 12 de outubro de 2016

“O Público em Privado”

Todo o homem terá como maior medo o seu fim. O receio de terminar uma vida sem condições dignas assombra qualquer um. Para dar luz a essa sombra, recorre-se a múltiplas filas de espera, inúmeras prescrições de medicamentos para doenças sem fim e um sorteio azarado de médicos.
A exigência de uma melhor qualidade de vida incutiu nas pessoas o sentido de preocupação com o seu estado de saúde. Hipocondríacos àparte, os nossos medos não terminam. Todos queremos ser bem tratados. Isso requer a atenção e carinho dos profissionais de saúde, bem como ter os melhores equipamentos à disposição para sermos tratados, condições de acessibilidade e acesso a hospitais de qualidade.
É, pois, doloroso ter em conta o sofrimento de muitos idosos em filas de espera, doentes crónicos sem o medicamento fulcral para a sua sobrevivência ou sem uma equipa especializada. Equipas essas que estarão certamente nos Hospitais Privados. Contudo, como tratar de trazer essas mesmas equipas para o público? De que forma fazer com que todos tenham acesso ao que de facto merecem?
Deste modo, é inequívoco que nem todos podem usufruir desse serviço privado. Mas porque razão será esse serviço tão caro se o fim de quem trabalha nesse ramo não é o lucro? A verdade é que muitos dos hospitais privados não têm uma procura que esgote a sua capacidade de resposta. Isto talvez se justifique pela maior eficiência destes de resposta comparativamente aos hospitais públicos. Porventura, estamos já na altura de melhorar este racionamento de utentes. Há, assim, uma desigualdade injusta neste acesso a melhores condições de tratamento.
É inegável que a ADSE é um sistema bastante injusto. Uma forma justiceira de resolver esta questão poderia passar pelo alargamento do benefício das condições que a ADSE proporciona à população geral. Sabendo nós que tal seria insuportável do ponto de vista das contas públicas, perde-se a esperança num Sistema de Saúde perfeito.
O caso do Hospital Senhor do Bonfim, na Póvoa de Varzim/Vila do Conde, choca qualquer utente pois foram investidos cerca de 100 milhões de Euros, sem recurso a financiamento bancário ou de outro fundo qualquer (talvez seja essa o motivo da não ajuda do Estado Português), e este não serve boa parte da população destas 2 cidades nem de outras cidades vizinhas. É um caso de dinheiro desaproveitado, enquanto muitos doentes sofrem à espera de uma cama ou de um tratamento adequado num outro local sem as mesmas luxuosas condições que este hospital oferece. Todos os estes fatores revelam um Estado antiquado, sem capacidade de inovar ou ter atrevimento para dar algo melhor aos seus cidadãos e contribuintes. Há um claro subaproveitamento dos hospitais privados existentes em Portugal, sendo necessário tocar na ferida e ter em conta os acordos existentes nas Parcerias Público-Privadas, que decorrem sempre de “lobbies” e outros interesses que não os da sustentabilidade das finanças públicas a longo prazo.
A verdade é que a condição económica e financeira do nosso país não ajuda a tratar estas situações e outras semelhantes. O asfixiamento provocado pela necessidade de agradar aos nossos superior europeus entope os nossos hospitais públicos, enquanto autoestradas outrora financiadas por fundos europeus ficam vazias e, por vezes, percorridas por ambulâncias que substituem Maternidades desaparecidas do nosso mapa de estabelecimentos de saúde, nos quais vamos lentamente morrendo.
Em suma, pede-se uma reformulação do nosso Sistema de Saúde, um sistema que possa ser bem mais justo e disponível a toda a população, ao mesmo tempo que se disfarçavam os problemas das finanças públicas, sendo possível seguir outras ideologias e métodos já implementados noutros países.

Jorge Pereira

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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