quinta-feira, 12 de outubro de 2017

Catalunha – a certeza da incerteza, ou o jogo das antecipações…

A Espanha é o sétimo país da OCDE num ranking de descentralização dos poderes fiscais, e o primeiro em intensidade de sua descentralização, entre 1995 e 2004 (Fiscal Federalism, OCDE, 2016). A Freedom House concede à Espanha a pontuação máxima em direitos políticos e civis: 95/100, a mesma, por exemplo, que a Alemanha. O “Economist” dá ao país 8,3 em 10 no seu índice sobre democracia, um valor situado entre o da França (7,92) e da Alemanha (8,6). O Projeto Politi IV, que mede o autoritarismo e a evolução da democracia, coloca a Espanha no máximo de democracia (10) desde 1982 e, no seu relatório de 2017 sobre direitos humanos, a organização Human Rights Watch não menciona a qualquer supressão de direitos na Catalunha.
No plano económico, a perceção de que a região da Catalunha contribui mais para a administração central do que aquilo que recebe é generalizada e compreensível, uma vez que é das regiões mas ricas de Espanha, sendo um dos motores da economia espanhola. No entanto, os números outrora apresentados acerca das diferenças entre as contribuições e os benefícios económicos foram entretanto relativizados. E quando os “contribuintes líquidos” da Europa do norte se insurgiram e exigiram pagar menos para o orçamento comum, em detrimento dos europeus do sul, as autoridades catalãs não apoiaram a sua causa. É a mesma solidariedade entre províncias que está em cima da mesa.
O início da reação à incerteza decorrente da possível declaração unilateral de independência foi o anuncio da deslocação das sedes dos bancos SABBADEL e CAIXABANK para fora da Catalunha. O primeiro vai para Valencia e o segundo para Las Palmas. Se, para os clientes, essa mudança só representa a garantia que os depósitos ficaram em Euros e a coberto do BCE, ao nível fiscal significa uma diminuição da receita para o governo de Barcelona, que também se prepara para perder outras grandes empresas cotadas em bolsa,  muito renitentes à turbulência gerada pela possível separação.
Mais do que as ameaças e os avisos enviados por parte do governo de Madrid com as cargas policiais e a retirada do estatuto de autonomia, a realidade e a antecipação levada a cabo pelos grandes grupos económicos, na defesa dos interesses dos seus acionistas e na procura de estabilidade e certeza, vai condicionar a posição de muitos Catalães. Existe, no entanto, sempre a vontade soberana de um povo que deve ser ouvida e respeitada. Mesmo legitimas, as demonstrações de força do poder central só abonam a favor da causa nacionalista. A melhor forma de chamar à razão o povo, bem como as autoridades autonómicas, será através da demonstração de enfraquecimento económico da região, se persistir em querer isolar-se de Espanha e dos seus parceiros europeus, que só poderão ser solidários com o reino.
A politica contra cíclica e de atomização de um espaço económico e mesmo cultural num mundo cada vez mais global, não faz, na minha opinião, sentido, nem serve os interesses da maioria dos Catalães. A tensão e o limite de não retorno que pode ser atingindo é muito preocupante mas as repressões policiais são contraproducentes e o uso da força pode legitimar as aspirações separatistas. O clima interno é de medo e, no limite, poderemos ter uma luta fratricida. Ou talvez as autoridades de Barcelona só pretendam pressionar Madrid para baixar o seu contributo para o reino e aumentar os benefícios para os seus habitantes.
Sendo uma das maiores economias europeias e o principal parceiro económico de Portugal, a agitação politica espanhola causará ajustamentos nas trocas comercias. E todos nos sabemos que, quando “Nuestros Hermanos” apanham frio, Portugal constipa-se.

José Jacinto da Costa Correia

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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