sexta-feira, 6 de outubro de 2017

Os milhões Europeus

Entre 2014 e 2020, através do programa Portugal 2020, está prevista a alocação de 25.79 mil milhões de euros para Portugal, com 16 programas nacionais e regionais. Com uma contribuição nacional de 6.89 mil milhões, Portugal dispõe de 32.39 mil milhões para investir em diversas áreas, desde educação a eficiência energética, bem como no fomento do empreendedorismo e I&D.
Estes fundos comunitários são cruciais no desenvolvimento da nossa economia, o que se justifica com o facto de a nossa nação ter sido onde, no período entre 2014 e 2016, os fundos ESI (European Structural and Investment Funds) representaram a maior percentagem do investimento público de todos os países da União Europeia, ascendendo a cerca de 80% do montante total.
Entre muitos dos objetivos traçados, destacam-se o aumento dos gastos em I&D para 2,7% do PIB nacional, baixar a taxa de abandono escolar para os 10% e a obtenção de educação terciária por parte de 75% da população com idades compreendidas entre os 30 e 34 anos. Também se pretende que a taxa de emprego na faixa etária dos 20 aos 64 anos atinga os 75%.
Apesar da chegada de mais de 100 mil milhões de euros desde a adesão à CEE (Comunidade Económica Europeia), em 1986, uma das conclusões do estudo “Três décadas de Portugal Europeu: balanço e perspetivas” foi que em 2013, último ano de aplicação do QREN (Quadro de Referência Estratégica Nacional), o nível de vida das famílias portuguesas era 25% inferior à média europeia, valores que eram apresentados já em 1990, apesar da franca evolução no sector da saúde e da educação.
Tendo em conta esta constatação, fará certamente sentido questionar a eficiência da alocação dos fundos anteriormente disponibilizados para a execução dos mais variados projetos. Com uma simples pesquisa, facilmente nos deparamos com inúmeras notícias dando conta de projetos que nunca saíram do papel, mas que apesar disso foram recipientes de milhares de euros e que, por exemplo, patrocinaram a compra de um Ferrari e outros carros de alta cilindrada. Custo? 5 milhões de euros.
No mundo dos projetos que implicavam a construção de estruturas, o cerco facilmente se apertou e os casos onde estes fundos não gerarão qualquer tipo de retorno serão certamente reduzidos, mas no que toca ao mundo da educação e formação, a situação não será certamente a mesma.
Inúmeras empresas foram criadas à volta dos fundos comunitários disponibilizados para a prestação de formação, conclusão que retiro pelo facto de se verem inúmeros anúncios a tentar recrutar pessoas para as ditas formações, e nada mais me parece que o que acontecia noutros campos é “reinventado” e aplicado noutros termos.
Por que razão surgiu uma oferta tão vasta? Simplesmente, por ser muito difícil controlar a qualidade da formação em questão, o que facilitava os malabarismos de oportunistas. Também inúmeras empresas, como se verificou em diferentes notícias, exigiam aos seus estagiários, abrangidos pelo programa Garantia Jovem, um pagamento para as despesas que estariam supostamente a cargo das empresas, como por exemplo a Taxa Social Única.
De momento, já se encontram alocados cerca de 106% dos fundos destinados ao YEI (Youth Employment Initiative) e mais de 50% foram efetivamente executados, sendo esta a taxa de execução mais elevada de todos os programas operacionais.
Prevê-se que cerca de 80 000 desempregados participem em algum tipo de formação e que cerca de 212 000 jovens beneficiem do YEI, mas a verdadeira questão é se esta formação trará algum tipo de valor e se as empresas irão continuar a aproveitarem-se deste tipo de iniciativas com o simples objetivo de lucrar diretamente com os fundos, esquecendo tudo o resto.
Este tipo de comportamento oportunista deveria ser fortemente penalizado, o que não acaba por acontecer, e os casos que surgem deveriam servir de exemplo para desmotivar tais ações.
Importa implementar programas como o Qualifica IT que, em parceria com a Universidade do Minho e o IEFP (Instituto de Emprego e Formação Profissional), têm como objetivo dotar licenciados desempregados das competências adequadas às necessidades das empresas da área de desenvolvimento de software. No final, este programa proporcionava estágios em várias empresas, entre as quais se destacam a Accenture, a Bosch Car Multimédia, o grupo DST e a Primavera BSS. No termo do programa, a taxa de empregabilidade atingiu os 65%, muitos dos quais integrados nas empresas onde estagiaram.
Observando estes dados, acho que se justificará a aposta nestes programas que mostram resultados fortemente positivos e que têm associadas instituições de peso no contexto nacional e internacional e que irão, pelo certo, atrair empregadores.
Perante resultados como estes, fará sentido reforçar e replicar iniciativas ligadas a instituições de ensino superior por todo país e assegurar formação de qualidade a todos aqueles que dela necessitarem, sem assim se perderem no limbo milhões de euros.

Carlos Daniel Silva Afonso

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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