quinta-feira, 19 de outubro de 2017

O orgulho de Turing

Hoje, circulam nas estradas da Califórnia carros que não necessitam de qualquer input humano e somos selecionados para uma entrevista de emprego sem nunca ninguém de pele e osso ter visto o nosso Curriculum Vitae.  
O que está a acontecer à nossa volta? Nos últimos anos, com a evolução do poder de computação e com a grande disponibilidade de dados, as potencialidades da inteligência artificial começaram a crescer vertiginosamente, desempenhando um papel cada vez mais importante no processo de decisão de instituições e em muito daquilo que nos rodeia.
De uma forma simplista, a inteligência artificial é o ramo da ciência da computação que se propõe elaborar software que simule a capacidade humana de raciocinar, perceber e tomar decisões.
A utilização deste tipo de software permite reduzir o espaço para erros humanos. Um exemplo prático é o sistema de travagem automático de um automóvel, que impedirá o embate em obstáculos, ou o sistema de reconhecimento automático de matrículas usado por forças policiais. As aplicações desta linha de software são quase infinitas e poderão proporcionar um aumento muito visível na qualidade de vida, tendo em conta tudo aquilo que poderá simplificar, tornar mais eficaz e eficiente.
Com o advento desta “nova” tecnologia, o termo Destruição Criativa, cunhado pelo economista austríaco Schumpeter, toma uma relevância nunca antes vista. Esta expressão refere-se ao incessante processo e produto da inovação, pelo qual novas unidades de produção substituem as unidades ultrapassadas. Este processo de reestruturação é de extrema relevância para a performance macroeconómica, não apenas no crescimento a longo prazo, mas também nas flutuações económicas, ajustes estruturais e funcionamento dos mercados.
Tipicamente, durante períodos de recessão, caraterizados pelo abrandamento de reestruturações, o processo de destruição desacelera, o que implica custos económicos que não são contabilizados. Obstáculos, como o referido acima, poderão ter consequências macroeconómicas graves a curto, mas também a longo prazo.
Mas o que significa este progresso para nós, humanos? Iremos ser substituídos por máquinas e por software? Deixaremos de ter empregos? Como é que a economia será afetada?
As opiniões variam, mas segundo um relatório elaborado pela PwC, cerca de 30% dos empregos que existem atualmente no Reino Unido poderão ser facilmente automatizados no início da década de 2030, valor que atinge os 38% nos Estados Unidos e 35% na Alemanha. Mas, na realidade, nem todos estes empregos estarão em perigo devido a variadas razões económicas, legais e regulatórias, consequentemente o impacto real da automação no emprego total é muito difícil de prever, mas este poderá até ser positivo, tendo em conta que, com a evolução do mercado de trabalho, vão surgindo novas posições, e as vagas criadas poderão superar aquelas que o progresso tecnológico destruirá.
Os salários devem aumentar devido aos ganhos em produtividade, mas estes ganhos não serão, provavelmente, distribuídos de forma uniforme por todos os diferentes escalões salariais, o que poderá agravar os níveis de desigualdade. Também se prevê que os ganhos associados a uma formação superior e skills não automatizáveis aumentem de forma relevante.
Juntamente com o provável agravamento da desigualdade devido à não redistribuição dos ganhos de produtividade, surgem ideias para medidas que poderão combater esta tendência, como o rendimento básico universal.
Esta ideia, que já não é recente, tem sido fortemente discutida, isto devido ao receio da automatização de muito daquilo que conhecemos. Este novo apoio substituiria todos os outros e seria atribuído a todos os cidadãos, numa base individual e não sendo necessário apresentar qualquer comprovativo de procura de emprego para beneficiar do mesmo. De momento, estão a ocorrer vários programas piloto, procurando a obtenção de mais dados quanto ao impacto do rendimento, visto que existe a preocupação do desincentivo à procura de emprego. Por outro lado, argumenta-se que este rendimento básico garantido poderá incentivar os indivíduos a arriscar e, consequentemente, através de inovação, acelerar o processo de evolução de toda a economia.
Qual será o real impacto desta revolução, ninguém sabe ao certo, mas todos nós somos responsáveis por guiar a sua evolução, tendo em conta as decisões que tomamos no nosso dia-a-dia como consumidores, cidadãos e investidores.
Temos uma oportunidade única de projetar as maiores dádivas da natureza humana e que nos distinguem de qualquer outro ser ou máquina - criatividade e empatia - criando um futuro que reflita os nossos objetivos comuns, como sociedade. No final de contas, está tudo nas nossas mãos.

Carlos Daniel Silva Afonso
  
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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