terça-feira, 24 de outubro de 2017

Orçamento de Estado insosso

A proposta de Orçamento de Estado para 2018 trouxe consigo um novo imposto. No que toca a impostos indiretos e, à semelhança do sucedido no anterior Orçamento de Estado para 2017, o atual executivo volta a apostar na tributação do consumo de produtos alimentares nocivos à saúde pública. Desta vez, aumenta o imposto sobre o consumo de bebidas açucaradas e cria outro que incidirá sobre alguns alimentos com sal.
     De acordo com o relatório, o Governo criará um imposto no valor de 0,80 euros por cada quilograma sobre as bolachas, biscoitos, batatas fritas e desidratadas e flocos de cereais, quando estes alimentos tiverem mais de um grama de sal por cada 100 gramas de produto. Esta taxa é aplicada por quem introduza no consumo este tipo de produtos ou pelos produtores.
     Em aspetos práticos, se a medida for para diante, poderá haver aumentos até 65% nestes produtos. Um pacote de bolachas de 200 gr., que esteja afetado pelo imposto, passará a pagar imposto de 16 cêntimos, ao qual acresce o IVA, totalizando um aumento de 19,68 cêntimos. Custando este pacote 30 cêntimos, passará a custar cerca de 50 cêntimos, o que representa um aumento de 65%. Percebe-se, contudo, que a finalidade do novo imposto não será certamente fiscal, uma vez que o Estado espera uma receita de 30 milhões de euros, que é "consignada ao Serviço Nacional de Saúde, para a prossecução dos programas para a promoção da saúde e para a prevenção da doença".
     Por outro lado, não são só os produtos com alto teor de sal que ficam mais caros. As bebidas açucaradas, que foram taxadas pela primeira vez este ano, vão voltar a encarecer. Na proposta do Orçamento de Estado é determinado um aumento na ordem dos 1,5% e uma nova diferenciação dentro destas bebidas. Entre fevereiro e julho, o consumo de refrigerantes e bebidas açucaradas desceu cerca de 25%, enquanto o consumo de bebidas menos açucaradas aumentou na mesma proporção.
     Também não será desta que surgem medidas que tributem o consumo de produtos com alto teor de açúcar e gorduras. Apesar de ser uma medida falada desde 2014 e, ainda este ano o ministro da saúde ter dito publicamente que pretendia avançar neste campo, teremos que esperar pelo futuro para que as chamadas “fat tax” sejam aplicadas.
     Por outro prisma, o imposto sobre o sal junta-se agora aos “impostos do pecado” – impostos sobre o jogo, o tabaco e o álcool –, ao imposto sobre os sacos de plástico e ao imposto  sobre as bebidas açucaradas. Ora, quando os impostos indiretos são responsáveis em diversos casos por metade ou um terço do preço de venda e, ainda assim, o Estado persiste no mesmo nível ou aumento da tributação direta – imposto sobre o rendimento das pessoas – há que pensar sobre o valor que o Estado acaba por nos custar. Ainda que este imposto seja para na área da saúde, os impostos diretos são uma receita e uma política fiscal do Estado.
     Em suma, é observável o empenho dos sucessivos governos na penalização de quem tem hábitos alimentares mais nefastos. É ainda um avanço tímido na tributação destes bens alimentares, mas que tem sido um bom ato, isto é, moralizador do consumo. Tomando o exemplo da tributação de bebidas açucaradas, esta medida, em meio ano, provou que os portugueses estão atentos aos preços e 50% destes admite que a quantidade de açúcar influencia a sua decisão na hora da compra. O facto de produtos menos nefastos manterem o preço leva a uma reflexão por parte do consumidor e tendência a consumir estes. O surgimento deste imposto é uma política extra-fiscal que valoriza a pedagogia comportamental e a saúde pública.

Luís António Sousa Cunha

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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