A
saúde mental nem sempre foi vista como um indicador de saúde pública, sendo
ainda nos dias de hoje por vezes subvalorizada. Segundo a OMS, a saúde mental é
o estado de bem-estar geral em que cada indivíduo compreende o seu próprio potencial
e é capaz de dar um contributo para si próprio e/ou para a sociedade. Com cerca
de 13% da população a sofrer de alguma perturbação mental, prevê-se que em 2030
as doenças e as perturbações mentais sejam a causa primária de doença a nível
global. Posto isto, é imperativo que esta matéria receba uma maior atenção, uma
vez que afeta as nossas vidas enquanto individuais e enquanto sociedade
económica.
Mas
em que medida pode a saúde mental impactar a economia? Ora, são vários os fatores
económicos que influenciam a saúde mental, tais como o aumento das situações de
pobreza, incerteza profissional, exclusão social, desemprego, entre muitos
outros. Deste modo, não é difícil perceber que as alterações na conjuntura
económica apresentam vários riscos psicossociais. Vários estudos sugerem que as
dificuldades financeiras e a incerteza económica aumentam a vulnerabilidade a
problemas de saúde mental e estão associados ao agravamento de perturbações
depressivas e de ansiedade, stresse, consumo de substâncias e suicídio. Por
outro lado, a própria saúde mental tem impacte na economia, verificando-se uma
associação inversa, ou seja, ter problemas de saúde mental pode interferir com
a produtividade, aumentar o absentismo e assumir-se preditor significativo de
desemprego.
De
facto, o Stresse e a Depressão são já a maior causa de morbidade nos países
desenvolvidos, vitimando mais pessoas, atualmente, que os acidentes de viação. Nos
dias de hoje, são mais de 30% os europeus afetados por problemas relacionados
com o stresse e são perdidos mais de um milhão de dias úteis de produtividade
por ano. Aliás, as principais causas de baixas no trabalho são razões
relacionadas com problemas de saúde mental. O stresse tem prejudicado em muito
a produtividade das pessoas e é notória a dificuldade em acompanhar o novo estilo
de vida, muitas vezes demasiado competitivo.
A
experiência de crises económicas anteriores sugere que as recessões são
prejudiciais para a saúde mental, apresentando um claro risco para o aumento de
sintomatologia psicopatológica. Nestes períodos, os fatores protetores da saúde
mental são enfraquecidos, os fatores de risco reforçados e a saúde mental é
negativamente afetada. À medida que o nível socioeconómico decresce, devido à
perda de rendimento, emprego, estatuto socioeconómico e autoestima, as pessoas
vivem maior incerteza (financeira, laboral, em relação ao futuro),
instalando-se a desesperança e os problemas de saúde mental.
Como
forma de dar resposta à crise financeira de 2008, houve um incentivo à adoção
de políticas de austeridade que, apesar de terem surtido algum efeito, os
custos das mesmas fizeram-se sentir de forma significativa a nível social. Pode
mesmo considerar-se que, apesar do seu ponto de partida financeiro, a crise que
afetou Portugal era, igualmente, uma crise social, colocando o nosso país
próximo dos lugares cimeiros da Europa no que concerne aos sentimentos de
ansiedade, tristeza e depressão.
De
acordo com estudos epidemiológicos de Saúde Mental, Portugal tem uma das taxas
mais elevadas de perturbação psiquiátrica, sendo as perturbações depressivas e
da ansiedade as mais relevantes. Se o cenário era já em si inquietante, o ano
de 2020 acrescentou ainda mais um peso – uma crise sanitária global. As
consequências da pandemia Covid-19 estão a ser devastadoras, arrastando consigo
problemas de saúde mental que deverão atingir, pelo menos, 40% da população em
Portugal, avizinhando-se um período de insegurança económica.
As
alterações económicas têm e continuarão a ter consequências na dimensão
psicológica das pessoas, pelo que é de grande importância implementar algumas
estratégias para a minimização dos efeitos das mesmas na saúde mental das
pessoas. É necessário investir mais e melhor na manutenção dos sistemas de
saúde mental e, principalmente, combater o estigma. Cuidados de saúde
acessíveis e programas ativos do mercado de trabalho e de alívio da dívida são
algumas das recomendações para minimizar os riscos acrescidos para a saúde
mental durante as recessões. É crucial que os serviços de saúde mental se
adequem às mudanças sociais, laborais e de estatuto socioeconómico da população
e que melhorem a prevenção e deteção precoce dos problemas de saúde mental.
Através
de um investimento em estratégias que apoiem os determinantes sociais da saúde,
os Governos e os sistemas de saúde poderão vir a economizar e a obter melhores
resultados a longo prazo, disponibilizando uma rede de apoio à saúde mental
mais completa. É preciso mobilizar para o setor da saúde mental recursos
financeiros públicos que sejam adequados e estáveis que produzirão ganhos
económicos a longo prazo, superando os custos imediatos.
Em
suma, a importância que a saúde mental tem na estruturação e manutenção da
sociedade é inegável e, como tal, não se pode manter esta tendência de negligência.
Sendo a “disponibilidade económica” um determinante fundamental para a saúde mental
das pessoas, quer de forma direta (acesso ao tratamento) quer de forma indireta
(desemprego e expetativas), a sua degradação terá sempre implicações
significativas no estado psicológico das pessoas.
Ana Catarina Fernandes
[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]
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