sexta-feira, 13 de novembro de 2020

Impostos e contribuições em Portugal: uma carga excessivamente elevada?

       O sistema fiscal e contributivo português tende a ser bastante (im)popular junto da generalidade da população, com todos a defenderem uma opinião fincada sobre o que o mesmo representa ou deveria representar. No entanto, é fundamental analisar a carga fiscal portuguesa de um ponto de vista mais imparcial, de forma a tentar entender se esta é ou não excessivamente elevada, análise essa que certamente conduzirá a resultados mais elucidativos se surgir de uma comparação com outros países e não, apenas, de uma avaliação individual.

       Importa, primeiramente, esclarecer que carga fiscal corresponde à relação existente entre a soma dos impostos e contribuições efetivas para a Segurança Social e o Produto Interno Bruto (PIB) de um país.

       No que à realidade portuguesa diz respeito, temos assistido a sucessivos valores recorde de carga fiscal. Por comparação com outras realidades, verificamos que, por um lado, quando a análise é feita entre os membros da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE), Portugal ocupa a 3ª posição na lista de países com um maior aumento da sua carga fiscal nos últimos 53 anos (subida de cerca de 19,1 pontos percentuais entre 1965 e 2018, quando atingiu os 34,8%). Por outro lado, uma análise comparativa com os membros da União Europeia (UE) revela que, em 2019, Portugal era o 10º país com menor carga fiscal, encontrando-se, inclusivamente, abaixo da média da UE, de acordo com as Estatísticas das Receitas Fiscais 1995-2019 (maio de 2020), disponibilizadas pelo Instituto Nacional de Estatística (INE).

Gráfico 1 – Carga fiscal dos países da União Europeia, em 2019



Fonte: INE. Estatísticas das Receitas Fiscais – 1995-2019 (maio de 2020)

As duas perspetivas apresentadas, apesar de não serem mutuamente exclusivas, podem gerar dúvidas relativamente à evolução da carga fiscal. Do meu ponto de vista, a análise dos fatores associados a cada uma é fulcral para que qualquer conclusão possa ser retirada. Por um lado, o facto de termos sido um dos países cuja carga fiscal mais cresceu é atenuado quando percebemos que este aumento se deveu à expansão necessária e significativa do setor público e da despesa social (com a criação da Segurança Social, em 1977), sobretudo no governo pós-ditadura. Por outro lado, a posição de Portugal no grupo de membros da UE com menor carga fiscal também parece perder um pouco do seu valor quando observamos que os países com cargas mais elevadas são também aqueles com maiores valores de PIB per capita e, por isso, com uma maior facilidade de, à partida, suportar estas contribuições individualmente.

Desta forma, para além de discutir se a carga fiscal é ou não elevada, considero que o centro da questão deveria passar mais por uma análise minuciosa da incidência destes impostos e contribuições e por um combate intenso à invasão fiscal. Isto porque, a meu ver, é bastante contraditório Portugal ser, simultaneamente, um país onde as famílias, sobretudo as que apresentam menores rendimentos, realizam elevados esforços fiscais/contributivos e um país com uma das maiores taxas de evasão fiscal (parcial e total) da Europa.

Considerando, por fim, a crise COVID-19 que vivemos, é igualmente fundamental questionarmo-nos sobre como será a evolução futura da carga fiscal portuguesa. No curto prazo, é esperado que a carga fiscal diminua para cerca de 33,9% (previsão presente no Orçamento de Estado 2021). Na minha opinião, esta descida não deve, todavia, ser encarada como algo positivo, já que não reflete uma diminuição de qualquer tipo de taxa de imposto (mantêm-se inalteradas) ou contribuição, mas sim um decréscimo das receitas fiscais (consequência direta da diminuição de rendimentos das famílias e das empresas, do decréscimo no consumo e do aumento do desemprego) e do PIB português.


Beatriz Costa Azevedo

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia da EEG/UMinho]

Sem comentários: