domingo, 1 de novembro de 2020

Tecnologia – ameaça ou aliada?

 

O mundo está cada vez mais dependente da tecnologia, onde a criação de novos mecanismos surge da necessidade de enfrentar falhas e melhorar a capacidade de resposta aos mais variados desafios. Daí levantam-se várias questões quanto àquilo que nos espera no futuro. Um dos temas que mais entra nesta discussão é o desemprego: serão os trabalhadores substituídos por máquinas?

Na última década, o volume de vendas de robôs industriais no mundo triplicou, atingindo 400.000 unidades em 2018, com o setor automóvel responsável por um terço da procura, sendo o Japão, China, Estados Unidos, Coreia do Sul e Alemanha os principais fornecedores do mercado mundial. A crescente automatização da indústria conduz inevitavelmente a alterações no mercado de trabalho, tanto no desaparecimento de profissões como ao nível da formação dos trabalhadores. Para um empregador pode ser mais atrativo ter uma máquina, que pode produzir com maior velocidade e menor custo, e não cometer erros humanos.

Este fenómeno foi há muito previsto por John Maynard Keynes, em 1930: “Estamos a ser atingidos por uma nova doença da qual alguns leitores podem não ter ouvido o nome, mas da qual ouvirão muito nos próximos anos - o desemprego tecnológico”. Leontief (1952) dizia também que, com a cada vez maior substituição dos trabalhadores por máquinas, não haveria espaço nas indústrias para empregar todos os que quisessem trabalhar. Mas será a automação responsável por causar desemprego?

Acemoglu e Restrepo (2017) analisaram o impacte dos robôs industriais no mercado de trabalho entre 1990 e 2007, evidenciando um efeito negativo em todas as profissões, exceto cargos de gestão, e que este efeito diminui à medida que o nível educacional do indivíduo aumenta, não havendo impacte em profissionais com pós-graduações. Assim, a educação terá um papel cada vez mais importante daqui para a frente. Os autores admitem que o uso de robôs é ainda limitado e, por isso, causou a perda de um número limitado de empregos, mas com o aumento da sua implementação previsto para o futuro empregos e salários poderão ser afetados.

Esta observação pode ser questionada no sentido em que se evidenciam tendências de aumento das especializações dos trabalhadores ocupando cargos mais altos e de maior rendimento. Além do mais, não poderão estar os jovens a formar carreiras em áreas em que a robotização não consegue (para já) chegar? Se um cargo está a tornar-se desnecessário, já não vão haver interessados a dedicarem-se a essa área. Pode ainda considerar-se uma modificação do modo de empregar a mão-de-obra dispensada noutras áreas onde a tecnologia menos intervém. Assim, as pessoas vão-se adaptando às modificações do mercado de trabalho, ao mesmo tempo que a nova introdução de tecnologia melhora a produtividade e competitividade das indústrias, permitindo a expansão do emprego.

Guy Ryder, o diretor-geral da Organização Internacional do Trabalho, acredita que novas tecnologias podem criar empregos, mas também roubar alguns, e que esta é uma realidade que teremos que enfrentar à medida que vamos entrando na chamada 4ª revolução industrial, pois, olhando para a história, as três primeiras revoluções industrias tiveram um “período de turbulência e ajuste”. Depois, saímo-nos melhor do que quando começamos, com mais empregos, de melhor qualidade e com padrões de vida mais elevados.  Porque não encarar esta mudança como uma libertação dos humanos? Permitir a redução dos horários de trabalho; menos tarefas “chatas”. Seria inverter a condição do “viver para trabalhar”

De facto, o tempo de trabalho diminuiu substancialmente no último século e meio. Segundo Walterskirchen (2016), as horas anuais de trabalho na Alemanha e França diminuíram em mais de 50% entre 1870 e 2000, no Reino Unido essa diminuição foi de 37% e nos EUA de 27%. As décadas que se seguiram ao fim da II Guerra Mundial foram também marcadas por uma diminuição significativa das horas de trabalho na Europa.

Daqui emerge outra questão: serão estes efeitos iguais em todo o mundo? Pode dizer-se que o avanço tecnológico está para o desenvolvimento do país assim como o desenvolvimento do país esta para o avanço tecnológico. Ou seja, países que enfrentam um rápido envelhecimento populacional, como a maioria dos países desenvolvidos, com cada vez menos jovens para trabalhar, necessitam de recorrer à tecnologia para compensar esse défice de força laboral. Já nos países em desenvolvimento, há uma tendência de rápido crescimento populacional e uma grande procura de trabalho jovem para desempenhar tarefas mais manuais e fisicamente exigentes. Aí, o progresso tecnológico pode não ser sustentável, pois as populações não têm condições financeiras e sociais para se adaptarem às alterações do mercado de trabalho.

Assim, quando utilizada de forma inteligente, a tecnologia pode proporcionar crescimento económico e melhores condições de vida das populações, aproveitando essa vantagem para transformar as comunidades que mais necessitam, e não apenas dar ainda mais lucro aos mais ricos.

 

Cláudia Ribeiro

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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