sábado, 19 de outubro de 2013

Dívida Pública e a Reorganização da Administração Publica

Será que é mau o facto de um Estado ter dívidas? Não, não é necessariamente mau que um estado tenha dívidas, pois o crédito é uma forte fonte de crescimento económico desde que seja gerido com prudência. Por exemplo, um Estado emite dívida a 10 anos para financiar o défice e até lá paga apenas juros. Se a economia desse país crescer a uma taxa superior à paga pelo empréstimo, este não terá dificuldades em pagar a sua dívida. Contudo, num país já endividado e com fraco crescimento económico, os encargos com juros podem comprometer o crescimento da economia e o pagamento da dívida. Um exemplo claro é Portugal.
O que sucedeu com Portugal foi que quando os investidores verificaram que a dívida do país tinha aumentado a pique na última década (de 50,4% em 2001 para 92,4% em 2010), devido a défices orçamentais sistemáticos, e a economia crescia muito pouco, muitos destes investidores deixaram de emprestar dinheiro a Portugal e outros passaram a exigir taxas de juro altíssimas, com receio que Portugal não conseguisse pagar a divida, ou seja, o país teve de pedir ajuda financeira para evitar a falência.
Cortes, reforma, crise, dificuldades, … são palavras da ordem do dia, desde então. Portugal, no âmbito do programa de resgate internacional por parte da Comissão Europeia, Banco Central Europeu e Fundo Monetário Internacional, foi sujeito a um programa de ajustamento que implica cortes na despesa do Estado, muitas vezes, cortes em áreas sensíveis e que podem eventualmente comprometer o desenvolvimento futuro do país, como a Educação ou a Saúde. Tendo em conta o actual cenário de instabilidade, tornou-se imperativo cortar, reformar e reorganizar o papel do Estado, sendo que, uma das últimas medidas adoptadas pelo governo português foi a reorganização da Administração Local, com o intuito de cortar nas despesas do Estado. Falamos, pois, da agregação de freguesias, medida que gerou muita polémica entre o povo português.
Se o objectivo é cortar na despesa do Estado, parece simples concluir que tal medida realmente permite ao Estado uma diminuição dos gastos, pois grande número de instituições sobrevive à custa das transferências do Estado, as quais representam uma grande fatia do Orçamento do Estado. Mas, na minha opinião, não está correcta a implementação desta medida.
Quanto à minha discordância em relação à medida implementada, esta surge, depois de analisar o reporte do défice e da dívida das Administrações Públicas, segunda notificação de 2013, do INE, relativa ao Procedimento dos Défices Excessivos (PDE). Nesse documento, podemos ver claramente que a administração local está a contribuir positivamente (não apresentando défices) para o controlo da dívida pública, assim como os fundos de segurança social, que nos últimos anos têm apresentado valores muito positivos. No entanto, espera-se que neste ano de 2013 apresentem um resultado negativo. E eu pergunto-me porque é que o estado português quer reduzir as despesas na administração local, se esta está a apresentar resultados positivos ou, se negativos, valores muito próximos de zero. Acho que a preocupação deveria ser aquilo que efectivamente está a contribuir de forma negativa, e muito negativa, para o aumento da nossa dívida.
Outro dado interessante do reporte acima mencionado é que as administrações públicas apresentam um resultado negativo de 9.083,9 milhões de euros, onde a administração central contribui com 9.616,8 milhões de euros. Como dito anteriormente, são os resultados ligeiramente positivos da administração local e dos fundos de segurança social que estão a anular cerca de 600 milhões de euros do resultado negativo da administração central.
Para tentar corrigir este desequilíbrio tão grande na administração central não vemos serem lançadas medidas e por isso acho que seria bom que o governo português passasse a olhar com mais atenção para este facto, pois no meu ponto de vista se há necessidade de haver cortes nas despesas para equilibrar as contas do Estado, este deve em primeiro lugar cortar naquilo que efectivamente está a contribuir com resultados negativos; em segundo lugar, deve avaliar bem os cortes que se faz, pois o objectivo não pode ser só cortar nas despesas porque também é necessário pôr a economia a crescer e estamos a assistir consecutivamente a medidas que não contribuem para nenhum destes objectivos.
Segundo dados do INE, na sua segunda notificação de 2013, mencionada acima, podemos observar uma previsão para a divida pública portuguesa de 127,8% para o final deste ano de 2013. Ou seja, a dívida pública continua a crescer e, por consequência, o défice também e a economia portuguesa não cresce. Estamos perante o pior dos cenários para uma economia. São portanto necessárias medidas, mas medidas que não impeçam o crescimento económico e que protejam os mais desfavorecidos.

Ricardo Araújo

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1ºciclo) da EGG/UMinho]

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