quinta-feira, 24 de outubro de 2013

Rede nacional de carros elétricos – “15 milhões ao abandono”

            Muitos economistas afirmam que uma das maneiras de ajudar Portugal a ultrapassar a crise em que se encontra é investir. Será que investimentos como o que irei demonstrar em seguida são favoráveis para a economia e para o crescimento do nosso país?
            Há pouco mais de três anos, o Governo, que estava a cargo do Engenheiro José Sócrates, fez um investimento de 15 milhões de euros, saindo bem caro ao executivo e, principalmente, a todos nós. Este investimento baseia-se numa Rede Nacional de carros elétricos -“Mobi.e”, que permite o abastecimento dos veículos elétricos. Esta rede tinha como objetivo-chave diminuir as emissões de CO2 e reduzir a dependência energética do país. A aposta do governo previa que, já para o ano de 2020, 1 em cada 5 carros fossem elétricos. Um sonho muito difícil de se concretizar, até porque, com a chegada da “Troika”, terminaram os incentivos dados à compra destes veículos, o que fez com que, se os números anteriormente apresentados eram de difícil alcance, se tornassem agora praticamente impossíveis.
            Ao analisarmos os factos, vemos que foram instalados cerca de 1163 carregadores públicos em 427 localizações por todo o país, contudo estes veículos, no total, são exatamente 347, ou seja, se fizermos as contas, para cada carro elétrico existem, 3,37 pontos de carregamento, o que demonstra desde logo um sobredimensionamento do projeto. Para além disso, e para piorar os números apresentados até então, é de referir que 352 pontos de carregamento encontram-se avariados ou não comunicam com o sistema, outros 285 nunca foram utilizados ou não comunicaram consumos, ou seja, 1 em cada 4 pontos de carregamento teve consumo 0 desde que foi instalado. Para ficarmos mais esclarecidos, só em Lisboa, que aparentemente deveria ser o local onde estes pontos mais funcionassem, demonstra dados preocupantes, ou seja, existem 86 pontos onde nenhum carro alguma vez foi ligado. Dados do centro que monitoriza o sistema mostram-nos ainda que, ao todo, foram feitos 15.760 carregamentos, o que quer dizer que, em média, um ponto carregou pouco mais do que 13 vezes (13.5).
Para percebermos o sobredimensionamento do projeto, há dois concelhos que nunca tiveram qualquer carregamento, Portalegre e Bragança. Devido à falta de utilização destas máquinas, é possível vermos postos de carregamento em parques de estacionamento públicos, em que os lugares circundantes deveriam ser para estacionamento de veículos elétricos, com lugares sempre vagos ou com carros de outros tipos que não elétricos, pois os próprios vigilantes dos parques acabam por deixar, pela simples razão de que nunca viram nenhum carro a fazer qualquer tipo de carregamento elétrico.
            É importante referir que o projeto piloto era de 1300 postos de carregamento, dos quais 50 eram de carregamento rápido, que demora aproximadamente 30 minutos, e os restantes, que compõe o grosso da rede “Mobi.e”, podem demorar cerca de 8 horas. Contudo, no país inteiro, referi que estavam propostas 50 máquinas de carregamento rápido (úteis para viagens de longa distância). Acontece que apenas se encontra uma instalada em Vila Nova de Gaia. Perguntamo-nos então onde estão as outras 49 máquinas?! Estas encontram-se paradas nos armazéns do fabricante à espera de ordem para serem instaladas. Ou seja, os postos de carregamento rápido, que possivelmente trariam mais-valias para o projeto, encontram-se paradas. Simplesmente, estão à espera de destino, mas como nem as já instaladas têm utilização, estas mantêm-se com o fabricante.
Agora, com a abertura aos privados, existem 9 máquinas de carregamento rápido, ainda assim poucas quando comparadas com as de carga lenta. É importante referir que sem postos de carregamento rápido, não é possível a realização de viagens de longa duração, como por exemplo Porto-Lisboa, ficando os carros limitados a um ambiente citadino. Com isto, era então previsível que, dos poucos indivíduos que detêm carros elétricos, estes efetuam 95% dos seus carregamentos nas suas próprias casas.
            A meu ver, os factos que apresentei anteriormente são mais que visíveis da inércia do projeto “Mobi.e”. Este projeto demonstra-se completamente sobredimensionado e insustentável, o que em nada contribuiu para o crescimento económico do nosso país, pelo contrário. Foram gastos 15 milhões de euros sem qualquer rentabilidade, encontrando-se o projeto abandonado e sem capacidade aparente de se tornar lucrativo e benéfico para o país. É assim evidente que a resposta à questão inicial, quanto ao contributo deste tipo de investimentos para o nosso país, seja então negativa.

Rita Isabel Carneiro Araújo

Nota: texto elaborado com base em dados de Maio de 2013

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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