segunda-feira, 7 de outubro de 2013

O mercado livre não existe!

Grande parte da classe política foi criando ao longo dos tempos o estereótipo de que os mercados devem ser livres. Nesse seguimento, afirmavam (e ainda afirmam) que quando o Estado interfere para ditar o que os participantes no mercado podem ou não fazer, os recursos não são aplicados de forma mais eficiente. Assim sendo, se o Estado impõe um tecto nas rendas de casa, os senhorios perdem o incentivo para fazer a manutenção dos seus imóveis ou construir novas infra-estruturas. Por outro lado, se o Estado restringir a variedade dos produtos financeiros que podem ser comercializados, haverá sempre duas ou mais partes que poderiam ter beneficiado de transacções inovadoras adequadas para satisfazer as suas necessidades específicas e que não aproveitam os possíveis ganhos da contratação.
Todavia, o mercado livre não existe! Todo e qualquer mercado opera segundo determinadas regras e limitações, que restringem a liberdade de escolha. Um mercado apenas pode parecer livre, uma vez que aceitamos de forma incondicional as restrições que lhe subjazem, o que nos impede de as ver. O grau de liberdade de um mercado não deve ser definido objectivamente, dado que se trata de uma definição política. 
A pretensão habitual de alguns economistas, que dizem que estão a tentar defender o mercado das interferências por parte de um governo politicamente motivado, é falsa. Mas, na verdade, o comércio livre é justo? Julgo que qualquer cidadão informado acredita que a China e a Índia realizam comércio internacional que pode ser livre, mas que não é justo. Pagar aos trabalhadores salários inaceitavelmente reduzidos e ao fazê-los trabalhar em condições precárias ou inumanas, estes gigantes asiáticos competem de forma injusta. Estes também podem ripostar dizendo ser inaceitável que os países ricos, ao mesmo tempo que defendem o mercado livre, tentam impor barreiras às suas exportações, tendo em conta que exploram o único recurso de que dispõe em abundância – trabalho barato. Embora estes países asiáticos não se possam dar ao luxo de pagar salários ocidentais ou proporcionar as condições de trabalho, podem certamente melhorar os salários e as condições de trabalho. Assim perspectivado, o debate acerca do comércio justo baseia-se essencialmente nos valores morais e decisões políticas, e não economia no sentido habitual.
Em suma, quebrar a ilusão da objectividade do mercado é o primeiro passo na compreensão do capitalismo.

André Torres Oliveira da Silva

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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