A
poupança representa, desde há muitas décadas, uma das variáveis de maior
impacto nos modelos de crescimento económico, sendo vista, conforme sugere o
sistema de contabilidade nacional, como o valor disponível para financiar a
acumulação de capital, estabelecendo uma relação direta com o Investimento.
Contudo,
nos últimos anos, num processo designado de globalização financeira, esta
relação tem vindo a desaparecer, uma vez que foi permitido ao países
financiarem-se com maior facilidade nos mercados internacionais, aumentando
consideravelmente a sua dívida externa e o seu défice, tendência idêntica que é
evidenciada nos países em dificuldade.
Assim,
países como Portugal, em que a tendência decrescente da taxa de poupança foi
claramente esquecida e que atravessa agora dificuldades, o debate em torno da
poupança volta a fazer parte do quotidiano dos políticos e cidadãos em geral
quando a falta de financiamento surge, requerendo de novo o importante papel
desta variável.
Em
Portugal, desde o 25 de Abril, a poupança situou-se quase sempre abaixo dos 20%
do rendimento disponível. Para este valor alarmante contribuíram vários fatores
como o período de crescimento económico extraordinário que se verificou no
período após a adesão à CEE, com um clima externo favorável e com as
transferências comunitárias, além do importante facto de se ter alcançado
estabilidade nos agregados macroeconómicos após 1985, com a segunda intervenção
do FMI no nosso país. Além da adesão à CEE, podemos realçar também a queda das
taxas de juro e da inflação com o esforço para a execução dos critérios de
adesão à moeda única, e a liberalização do sistema financeiro que levantou o
sistema de limitação de crédito e reduziu a taxa de reservas obrigatórias,
facilitando assim o acesso ao crédito por parte das famílias e empresas, o que
engendrou o acréscimo do seu endividamento.
Toda
esta envolvente eufórica, com elevado crescimento económico e a integração
portuguesa na Comunidade Económica Europeia, provocou elevadas expectativas
junto das famílias, que aumentaram assim o seu consumo, desajustando o seu consumo
das suas possibilidades de produção, provocando uma queda da taxa de poupança
de 24% do rendimento disponível para apenas 10%, no período 1985-1990.
O
Estado assume, também, um papel importante nesta queda da importância da
poupança no nosso país, sobretudo quando vemos que desde o 25 de Abril a
poupança do Estado tem sido sempre negativa, ampliando o valor da dívida
pública. Com a redução das taxas de juro, verificadas aquando da adesão à moeda
única, o Estado português usufruiu dessa posição para se endividar no exterior.
Deste modo, introduziu e financiou o Estado Social, que universalizou o acesso
à educação, à saúde e a garantia das pensões de reforma, reduzindo os
incentivos à poupança e aumentando a qualidade de vida dos cidadãos e, por sua
vez, o consumo.
Dada a
conjuntura atual, é difícil praticar políticas fiscais que incentivem a
poupança, pelo que a única maneira que o Estado tem para estimular a mesma é
ser ele mesmo a dar o exemplo, cortando na despesa. Deste modo, o Estado deve
suavizar o seu papel ubíquo e de elemento central na Economia do nosso país,
cortando nas PPP’s, transferências para pensões, despesas com pessoal, entre
outros.
No
futuro, há também que recuperar a importância da aquisição de instrumentos
financeiros, como ações, depósitos a prazo, fundos de investimento,
certificados de aforro e até dívida pública, de modo a reter as poupanças das
famílias, tornando os produtos mais eficientes e de conhecimento do público em geral,
o que ainda não acontece hoje em dia, uma vez que dados empíricos revelam que a
probabilidade de deter algum destes instrumentos aumenta com, por exemplo, o
nível de educação dos cidadãos. Para tal, o Estado deve incrementar
estabilidade e previsibilidade nas políticas de promoção da poupança (algo que
foi violado em 2006 e 2008, com a revisão das remunerações dos certificados de
aforro, aumentando a desconfiança dos cidadãos em relação às políticas do
Estado).
Finalizando, é de exaltar que a poupança é,
sem dúvida, uma variável com papel central que não pode voltar a ser esquecida,
sobretudo dada a situação de dívida externa que o país enfrenta e a
possibilidade de, no futuro, não termos as nossas reformas garantidas, devendo
o Estado ter um papel ativo na promoção da mesma.
Rogério
Carvalho
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