domingo, 14 de outubro de 2012

A Poupança em Portugal: a sua relevância e o seu esquecimento

A poupança representa, desde há muitas décadas, uma das variáveis de maior impacto nos modelos de crescimento económico, sendo vista, conforme sugere o sistema de contabilidade nacional, como o valor disponível para financiar a acumulação de capital, estabelecendo uma relação direta com o Investimento.
Contudo, nos últimos anos, num processo designado de globalização financeira, esta relação tem vindo a desaparecer, uma vez que foi permitido ao países financiarem-se com maior facilidade nos mercados internacionais, aumentando consideravelmente a sua dívida externa e o seu défice, tendência idêntica que é evidenciada nos países em dificuldade.
Assim, países como Portugal, em que a tendência decrescente da taxa de poupança foi claramente esquecida e que atravessa agora dificuldades, o debate em torno da poupança volta a fazer parte do quotidiano dos políticos e cidadãos em geral quando a falta de financiamento surge, requerendo de novo o importante papel desta variável.
Em Portugal, desde o 25 de Abril, a poupança situou-se quase sempre abaixo dos 20% do rendimento disponível. Para este valor alarmante contribuíram vários fatores como o período de crescimento económico extraordinário que se verificou no período após a adesão à CEE, com um clima externo favorável e com as transferências comunitárias, além do importante facto de se ter alcançado estabilidade nos agregados macroeconómicos após 1985, com a segunda intervenção do FMI no nosso país. Além da adesão à CEE, podemos realçar também a queda das taxas de juro e da inflação com o esforço para a execução dos critérios de adesão à moeda única, e a liberalização do sistema financeiro que levantou o sistema de limitação de crédito e reduziu a taxa de reservas obrigatórias, facilitando assim o acesso ao crédito por parte das famílias e empresas, o que engendrou o acréscimo do seu endividamento.
Toda esta envolvente eufórica, com elevado crescimento económico e a integração portuguesa na Comunidade Económica Europeia, provocou elevadas expectativas junto das famílias, que aumentaram assim o seu consumo, desajustando o seu consumo das suas possibilidades de produção, provocando uma queda da taxa de poupança de 24% do rendimento disponível para apenas 10%, no período 1985-1990.
O Estado assume, também, um papel importante nesta queda da importância da poupança no nosso país, sobretudo quando vemos que desde o 25 de Abril a poupança do Estado tem sido sempre negativa, ampliando o valor da dívida pública. Com a redução das taxas de juro, verificadas aquando da adesão à moeda única, o Estado português usufruiu dessa posição para se endividar no exterior. Deste modo, introduziu e financiou o Estado Social, que universalizou o acesso à educação, à saúde e a garantia das pensões de reforma, reduzindo os incentivos à poupança e aumentando a qualidade de vida dos cidadãos e, por sua vez, o consumo.
Dada a conjuntura atual, é difícil praticar políticas fiscais que incentivem a poupança, pelo que a única maneira que o Estado tem para estimular a mesma é ser ele mesmo a dar o exemplo, cortando na despesa. Deste modo, o Estado deve suavizar o seu papel ubíquo e de elemento central na Economia do nosso país, cortando nas PPP’s, transferências para pensões, despesas com pessoal, entre outros.
No futuro, há também que recuperar a importância da aquisição de instrumentos financeiros, como ações, depósitos a prazo, fundos de investimento, certificados de aforro e até dívida pública, de modo a reter as poupanças das famílias, tornando os produtos mais eficientes e de conhecimento do público em geral, o que ainda não acontece hoje em dia, uma vez que dados empíricos revelam que a probabilidade de deter algum destes instrumentos aumenta com, por exemplo, o nível de educação dos cidadãos. Para tal, o Estado deve incrementar estabilidade e previsibilidade nas políticas de promoção da poupança (algo que foi violado em 2006 e 2008, com a revisão das remunerações dos certificados de aforro, aumentando a desconfiança dos cidadãos em relação às políticas do Estado).
 Finalizando, é de exaltar que a poupança é, sem dúvida, uma variável com papel central que não pode voltar a ser esquecida, sobretudo dada a situação de dívida externa que o país enfrenta e a possibilidade de, no futuro, não termos as nossas reformas garantidas, devendo o Estado ter um papel ativo na promoção da mesma.

Rogério Carvalho

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho] 

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