A apresentação do Orçamento de Estado para 2013 assinala, de forma
clara, um processo generalizado na direção da austeridade como única solução
viável para o imbróglio das contas públicas portuguesas. Contudo, apesar de
toda a retórica associada às instituições Europeias defender a necessidade de
um regime de austeridade como forma de propiciar um acréscimo de
competitividade que, por sua vez, revigore o tecido económico, verificamos que
na realidade a posição portuguesa tem vindo a deteriorar-se, lentamente mas de
forma inequívoca.
Atualmente, Portugal
observou a sua dívida pública ascender aos 117,5% do Produto Interno Bruto,
ficando apenas atrás da Grécia (150,3%) e da Itália (126,1%) no total do
conjunto da União Europeia. Convêm salientar que uma parte importante da dívida
acumulada não resulta diretamente do impacto da crise que teve o seu início em
2008, graças à precariedade do setor imobiliário norte-americano, que se
alastrou ao sistema financeiro e prontamente propagou-se pelo restante globo,
mas sim a uma prática não publicitada de desorçamentação implementada por
vários governos portugueses de forma a cumprirem as metas do défice para a qual
contraíram inúmeros empréstimos externos. Constatamos que o intuito previamente
mencionado não é apenas eticamente desonesto como prejudicial para a Economia,
sendo que as quantias adquiridas através do endividamento não são investidas
mas sim consumidas, e expeditamente descartadas. Com o valor da dívida a não
demonstrar sinais de abrandamento, estando perigosamente perto dos 200 mil
milhões de euros, e uma conjuntura de austeridade extremamente desfavorável a
qualquer tipo de crescimento, chegando a encorajar a depreciação da
mão-de-obra, concluímos que o pagamento fica cada vez menos exequível,
principalmente nos preços e prazos acordados com a Troika.
O fator fulcral para o
futuro imediato de Portugal será a “sustentabilidade” da sua dívida, o que por
sua vez é largamente dependente da dimensão da recessão que vamos experienciar,
ou seja, se o acréscimo da tributação fiscal juntamente com as restantes
medidas de austeridade prolongarem o período recessivo sem que haja uma
estabilização dos juros aquém dos 7%, ver-se-á um crescimento explosivo do
valor da dívida pública. A estimativa do Fundo Monetário Internacional (FMI)
aponta para os 134% como sendo a meta que indica o momento em que Portugal deixa
definitivamente de ter qualquer hipótese de pagamento, um cenário que tem sido
pouco publicitado.
As condições que
rodeiam a temática da dívida levantam inúmeras referências a reestruturações,
algo que pode ser definido pela ótica de um incumprimento que é negociado com
os próprios investidores, tendo em vista o reescalonamento da dívida pública
graças ao prolongamento da maturidade dos títulos e à redução das taxas de
juro. Apesar de numa primeira análise o conceito de reestruturação ser
singularmente apelativo, verificamos que também acarreta algumas desvantagens,
principalmente se tivermos em conta que desde que o rating de Portugal passou a ser classificado como “lixo”, o
investimento estrangeiro dissipou-se rapidamente. A saída de Portugal do
mercado implica que os principais credores da dívida pública sejam as entidades
FMI e Banco Central Europeu, juntamente com a própria banca portuguesa, o que
garante que não seria apenas o exterior com algo a perder. Talvez o maior
argumento em detrimento da reestruturação da dívida seja o grau de exposição do
sistema bancário Alemão e Francês às dívidas dos países europeus periféricos,
razão pela qual a União Europeia adota uma posição oficial de intransigência.
A outra alternativa
seria o incumprimento (“default”), em que o Estado Português recusar-se-ia a
honrar as suas obrigações, declarando insolvência, uma opção que deve ser posta
de parte pelas suas consequências potencialmente catastróficas, particularmente
a quebra no financiamento e a desvalorização do nível médio de vida, já sem
mencionar as repercussões legais.
Concluindo, a aposta na
austeridade comprometendo o crescimento económico pode aplacar no curto-prazo
as exigências dos credores mas irá certamente apenas maquilhar o perigo
subjacente de não haver receita para reembolsar a dívida. Assim, penso que a
única solução possível vai ter de passar por um perdão parcial da dívida, uma ação
que depende implicitamente de uma mudança ao nível das mais altas instâncias
europeias. É necessário deixar de haver duas Europas a ritmos distintos e em
que o pretexto da união económica é utilizado para o favorecimento de um ciclo
restrito. Tudo isto não iliba a passividade do governo português, sendo fulcral
uma transformação da orientação da política económica e financeira.
Duarte Guilherme Araújo Guedes Machado
[artigo de opinião desenvolvido no âmbito da unidade curricular
“Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da
EEG/UMinho]
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