sexta-feira, 5 de outubro de 2012

“Vou-me embora!”

              “Melhorar as condições de vida” é o objectivo principal de todos os homens e mulheres que ao longo do tempo e por várias razões decidem deslocar-se de uma região para a outra. Os movimentos migratórios não são um assunto de ontem nem de hoje, mas sim de sempre. Diariamente nos chegam notícias sobre esses mesmos movimentos, invocando-se factores económicos, religiosos e políticos como motivos apontados para o abandono dos locais de origem. Este é um fenómeno global e com uma dimensão demasiado grande para que possamos ignorá-lo.
            Os movimentos migratórios fazem parte das estatísticas portuguesas desde há muito tempo, sendo que esta história começa com a saída de colonos para se fixarem nas ilhas dos Açores e da Madeira em meados do século XV. Ao longo do tempo os movimentos emigratórios sofrem alterações em termos de volume, destinos e características dos emigrantes. Por exemplo, no início do século XX e até à Segunda Guerra Mundial, homens pouco qualificados procuravam países como o Brasil e os EUA. Finda a Guerra, era necessária mão-de-obra para a reconstrução da Europa pelo que no período entre 1960 e 1974 se registaram os valores mais elevados de emigração em Portugal: com os movimentos para as colónias africanas e países do centro da Europa, como França e Alemanha, estima-se que terão emigrado mais de 1,5 milhões de trabalhadores, na sua maioria pouco qualificados. É de salientar que neste período houve uma maior participação feminina e também de jovens menores de 15 anos, o que evidencia que famílias completas deixavam o país. Contudo, esta expansão foi travada pela crise energética e recessão económica verificadas.
            Já nos anos 80 assistimos a uma diversificação dos destinos: França, Alemanha, Suíça, Luxemburgo e Espanha eram os países europeus mais procurados, mas também os Estados Unidos, Canadá e Austrália eram postos na rota dos portugueses. Com a integração portuguesa na Comunidade Europeia criaram-se novas condições de mobilidade do trabalho, levando a que a emigração fosse em grande escala mas por períodos mais curtos – predominavam os trabalhadores jovens em idade activa, sobretudo homens. Estima-se que no período entre 1999 e 2003, 45% dos emigrantes possuíam o 2º ou 3º ciclo do ensino básico, 9% do ensino secundário ou superior e apenas 10% não tinham qualquer grau de ensino. Ou seja, ao longo das décadas os portugueses que emigram são cada vez mais qualificados. Será isso benéfico para o país?
            Segundo Lucas (1988) o motor de crescimento de uma economia é o capital humano, pelo que é necessário investir na educação e formação dos trabalhadores. Assim, é de realçar que a escolaridade média dos portugueses era de 3,15 anos em 1960 e passou para 7,89 anos em 2010. Apesar do notável progresso, Portugal continua ainda na cauda dos países da OCDE. Contudo, dado que se verificam melhorias na educação, então o suposto motor de crescimento está a funcionar mas porque não cresce o país? Porque vão os trabalhadores qualificados embora? Os números mais elevados de sempre da taxa de desemprego e o total desânimo das pessoas perante as previsões futuras são as principais justificações que eu encontro para a dita frase: “vou-me embora!”. Todos os dias ouço alguém lamentar-se que o país está mal e que a única solução é ir-se embora.
Podemos dizer que estamos em plena “fuga de cérebros”. Infelizmente, já antes da crise financeira de 2008 estimava-se que cerca de 20% dos nossos licenciados trabalhavam no estrangeiro. Portugal investiu em educação mas esqueceu-se que era necessário criar empregos para os milhares de alunos que terminam os seus cursos todos os anos. O estado português financiou a nossa educação durante anos e agora quem irá beneficiar dos seus frutos serão países como Angola, Brasil, Suíça, Reino Unido, entre outros, pois são estes países que são sinónimo de oportunidade. Isso mesmo, oportunidade de adquirir e aplicar novos conhecimentos, oportunidade de ter um futuro. Mais tarde ou mais cedo, dado que Portugal não tem uma economia dinâmica capaz de criar emprego e atrair mão-de-obra qualificada, esta problemática irá bater-nos à porta.
Os jogos de interesses políticos, a protecção de monopólios e o incentivo à emigração dos jovens farão com que o país perca o seu bem mais valioso, o único capaz de o fazer renascer – o capital humano qualificado. Que os movimentos migratórios façam parte da agenda do país ainda se aceita, mas desperdiçar pessoas qualificadas por não ser capaz de criar oportunidades, isso não.

Cristiana Rodrigues da Silva

[artigo de opinião produzido no âmbito da unidade curricular “Economia Portuguesa e Europeia” do 3º ano do curso de Economia (1º ciclo) da EEG/UMinho]

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